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As grandes potências miram a África

Márcio Cambraia

Márcio Cambraia

É importante registrar, nesse momento de mudanças no macro cenário internacional, que as grandes potências têm mostrado interesse em se aproximar do continente africano.

Os Estados Unidos promoveram, no período de 13 a 15 de dezembro de 2022, em Washington, reunião em que participaram 49 delegações de países africanos. Essa cúpula foi a primeira reunião abrangente realizada desde 2014, quando por iniciativa do então presidente americano Barack Obama realizou-se a primeira cúpula entre os EUA e países africanos. De acordo com o Departamento de Estado dos EUA a reunião daria prosseguimento a entendimentos estabelecidos pelo presidente norte americano durante suas visitas a países africanos. Teria como foco comércio, investimentos, segurança e democracia.

Antes da reunião de 2014 a China havia lançado em 2013, o importante programa Belt and Road, também chamado de Nova Rota da Seda, concentrado principalmente em investimentos em infraestrutura e que tinha como um de seus focos a África. A Nova Rota da Seda tem dado grande impulso à influência global da China. Embora a reunião de 2014 tenha sido inspirada também pelas ligações familiares do presidente Barack Obama com a África, não há dúvidas de que já havia uma reação dos EUA à crescente presença comercial da China no continente africano. Essa iniciativa americana não apresentou resultados relevantes, e durante a administração Trump a África não foi objeto de atenção. Trump chegou mesmo a se referir a países africanos de modo pejorativo, causando grande desgaste diplomático.

A cúpula de 2022 mostrou uma tentativa de recuperar terreno, pois desde 2013 a ofensiva chinesa com a concessão de créditos em condições favoráveis a países africanos têm reforçado os canais diplomáticos sino-africanos, apesar de críticas ao endividamento excessivo de países pobres e da utilização de mão de obra chinesa no lugar da africana em obras de infraestrutura. A China tem buscado garantir fontes de energia, e suprimentos minerais e agrícolas para a manutenção de seu crescimento econômico e sua política de aumentar o padrão de vida de sua população. Trata-se de estratégia consistente e de longo prazo, que os americanos buscam contrarrestar, mas por enquanto sem êxito.

A Rússia também tem buscado maior presença no continente africano, até mesmo como forma de mitigar seu isolamento internacional por causa da invasão da Ucrânia e das sançõesimpostas pela Europa e pelos EUA. Em Julho de 2022 o Ministro das Relações Exteriores Sergei Lavrov realizou um périplo pela África, tendo visitado o Egito, o Congo, a Etiópia e Uganda. Procurou afirmar a ajuda russa em termos de segurança alimentar, pois o continente africano tem sido muito prejudicado pelas interrupções no fornecimento de grãos causados pela guerra rusoo -ucraniana. Por outro lado, recorde-se que a Rússia herdou imagem favorável da antiga União Soviética de ser potência anti-imperialista, pois se deve recordar que durante a Guerra Fria, a URSS apoiou ativamente a luta contra as potências coloniais na África.

Depois de anos de ausência, por causa do desmantelamento da União Soviética, a Rússia busca ter maior presença e influência no continente africano. Vertente importante do papel russo é o fornecimento de armas, e estima-se que países africanos são responsáveis pela compra de aproximadamente vinte por cento das exportações de armas da Rússia. Ademais, sabe-se que o Wagner Group, exército privado, composto de mercenários que têm atuado em várias situações bélicas, teria ligações com o governo de Moscou, e funcionaria como braço auxiliar não oficial do governo russo para intervenções militares. Essa rede de mercenários tem presença em vários pontos da África e atua também no treinamento de tropas regulares.

De outra parte, as principais potências coloniais, o Reino Unido e a França, continuam a ter forte presença nas suas antigas colônias africanas, apesar de terem visto sua capacidade de projeção internacional de poder diminuir. Sua influência continua em termos comerciais, de venda de armas e treinamento militar e também com a utilização de “soft power “, com o qual o Reino Unido e a França mantêm vivos seus laços políticos e culturais com as antigas colônias.

Observe-se que algumas diretrizes de política externa americanas não têm tido a continuidade e a consistência necessárias para darem bons frutos. Há o exemplo da recente Cúpula afro-americana de 2022 que se caracterizou mais como reedição de ideias lançadas por ocasião da reunião de 2014, e sem um programa de investimentos robusto. Temos, ademais, o caso da Cúpula das Américas de 2022 que buscou corrigir o declínio da influência americana na América Latina, mas com escassas possibilidades de êxito, também pela falta de previsão realista de investimentos e de incentivos concretos ao comércio. Essas iniciativas não apresentaram consequências palpáveis e não tiveram continuidade, o que tem gerado frustrações e aberto espaço para a busca de influência da China, e mesmo da Rússia. Interessante observar que as ações dos EUA têm sido reativas, para se contrapor a situações com as quais a diplomacia norte-americana se defronta.

No que diz respeito ao Brasil, é importante que nossa diplomacia acompanhe acuradamente a ofensiva chinesa porque, em busca de fontes de fornecimento de “commodities” e minerais, o país asiático tem investido maciçamente na infraestrutura da África, o que pode abrir caminho para que alguns países africanos venham a ser concorrentes do Brasil na área de produtos de base.

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