O Brasil trocou a Alca pelo Bricstão e isso tem consequências

Madeleine Lacsko

Madeleine Lacsko

Na 15a cúpula dos Brics na África do Sul veio a notícia de que o bloco será dobrado, basicamente com ditaduras. Serão convidados Irã, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos e a Argentina.

Os cinco países devem entrar no bloco como membros plenos. Isso significa que terão a mesma representatividade e os mesmos direitos dos cinco membros originais, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

A se concretizar a proposta, que ganhou fôlego agora, China e Rússia podem ter feito uma grande jogada no tabuleiro geopolítico internacional. Seria uma força econômica e política com estatura para polarizar com o G7, o bloco dos países mais industrializados do mundo, composto por Alemanha, Candá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido.

Blocos econômicos não são agrupamentos baseados unicamente em comércio e economia. Eles se formam com base em uma visão de mundo comum, que pretendem fortalecer.

Na virada do século, o Brasil negociava na Cúpula das Américas a entrada na Alca, Área de Livre Comércio das Américas. A ideia era de que entrassem todos os países menos cuba. Barreiras comerciais seriam eliminadas pouco a pouco no bloco.

A última rodada de negociações foi em 2005. Um ano depois, em 2006, no meio do primeiro governo Lula, surge outro bloco, composto por Brasil, Rússia, Índia e China. A justificativa não era apenas econômica, era de visão de mundo. Todos eram países no mesmo estágio de desenvolvimento e juntos poderiam ser mais fortes. Em 2011 a África do Sul se juntou ao bloco.

Embora a narrativa fosse de um grupo de países no mesmo nível, não há dúvidas de que China e Rússia são países muito maiores e mais poderosos que os outros três. Além disso, têm uma visão bastante diferente sobre democracia. São culturas antigas nas quais a ideia de democracia simplesmente não existe.

É uma situação diferente dos outros três que, embora não sejam consideradas democracias liberais ou democracias plenas, têm sociedades que abrigam os ideais democráticos.

Agora que os Brics atingiram a maioridade, 18 anos depois da fundação, a situação geopolítica mudou. A China teve um crescimento impressionante tanto sob o ponto de vista econômico quanto de influência. A Rússia resolveu expandir seu poderio invadindo a Ucrânia e inaugurando uma guerra que mexe com o mundo todo.

O presidente Lula almeja uma atuação nesse conflito, segundo ele próprio, promovendo a paz. As declarações, no entanto, são duvidosas. Até o famoso “quando um não quer, dois não brigam” foi lançado em público. Isso para falar de uma invasão territorial que já rendeu condenação em tribunal internacional por genocídio devido ao sequestro de crianças ucranianas.

É uma situação que tem o potencial de afastar o Brasil de democracias com as quais temos laços históricos. O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenski, já declarou publicamente que o único a se preocupar com a segurança da Rússia na invasão é o presidente Lula.

No meio desse contexto, China e Rússia decidem incluir mais quatro ditaduras no bloco, algumas delas teocráticas. São países que desprezam os direitos das mulheres e punem de maneira exemplar os homossexuais.

É um discurso curiosamente oposto àquele adotado pelos progressistas que apoiaram a candidatura de Lula à presidência. Ele não perde uma oportunidade de defender publicamente a presença desses países no bloco.

A narrativa é de que um país não pode evitar relações comerciais com países que têm regimes de governo ditatoriais. Essa ideia é correta, não há forma de fazer isso num mundo globalizado. No entanto, ela não se aplica ao caso concreto. Fazer parte de um bloco engloba também a promoção de uma visão de mundo.

Inicialmente, a justificativa era unir países em desenvolvimento. Agora fica claro que o bloco seria formado majoritariamente por ditaduras. Está inaugurada a era do Bricstão. O Brasil fará parte e isso terá consequências.

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