A derrubada do IOF expôs mais do que um conflito fiscal — revelou uma crise política e moral

Ismael Almeida

Ismael Almeida

A recente derrubada, pelo Congresso Nacional, do decreto que aumentava o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) desencadeou mais do que um impasse entre Legislativo e Executivo. A resposta de setores ligados ao governo — incluindo uma campanha coordenada por influenciadores digitais com o lema “Congresso Inimigo do Povo” — revela algo mais grave: a tentativa de deslegitimar uma decisão institucional legítima e democrática, apenas porque contraria os interesses do Planalto.

O aumento do IOF, proposto por decreto presidencial, visava arrecadar R$ 12 bilhões em 2025. Mas os impactos desse imposto, muitas vezes invisíveis à primeira vista, recaem com mais força sobre as camadas mais pobres da população. Empréstimos pessoais, cartão de crédito internacional, remessas de dinheiro para o exterior, compras parceladas e até consultas médicas fora do país ficariam mais caros. Pequenos empreendedores e consumidores já endividados seriam diretamente afetados.

É nesse contexto que o Congresso agiu: derrubou uma medida impopular, com impacto negativo para milhões de brasileiros, e cobrou do governo que apresentasse alternativas mais justas para recompor a receita. Ao contrário do que dizem os ataques orquestrados por influenciadores com forte alinhamento ao governo — e com possível financiamento partidário —, essa atitude não torna o Congresso um “inimigo do povo”, mas sim um freio necessário contra uma política fiscal injusta e mal planejada.

A campanha difamatória nas redes sociais, que tenta jogar a população contra o Legislativo, é perigosa por dois motivos: primeiro, porque alimenta uma crise institucional entre os Poderes, num momento em que o país precisa de diálogo e estabilidade; segundo, porque desvia o foco do verdadeiro debate: de onde virá o ajuste fiscal, e quem vai pagá-lo.

E é aqui que está a verdadeira urgência. O governo tem, sim, alternativas para fechar as contas sem penalizar os mais pobres. Pode, por exemplo:
• Rever renúncias fiscais que drenam mais de R$ 500 bilhões ao ano, muitas sem retorno social comprovado;
• Reduzir gastos supérfluos da própria máquina pública, como diárias, passagens, publicidade institucional e aluguéis desnecessários;
• Utilizar parte dos lucros das estatais, como Petrobras e bancos públicos, para proteger programas sociais essenciais.

Nada disso foi discutido com profundidade pelo governo antes da edição do decreto. Preferiu-se o caminho mais fácil — aumentar imposto sem debate. Quando o Congresso impôs o limite, reagiu-se com ataques, desinformação e tentativas de desmoralização.

A boa política fiscal precisa de equilíbrio, responsabilidade e justiça. Mas precisa também de respeito às instituições e à democracia. Criminalizar o Congresso por cumprir sua função constitucional é sinal de autoritarismo travestido de virtude popular. E o povo — o verdadeiro povo — não pode ser usado como escudo para más decisões econômicas ou para campanhas de ataque político.

O Congresso não é inimigo do povo. O verdadeiro inimigo é um governo que, diante de erros, prefere transferir a culpa a quem o corrige, em vez de corrigir sua rota. E o povo brasileiro, atento e maduro, já começa a perceber isso.

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