Nos últimos dias, universidades de elite nos Estados Unidos estão em uma crise causada por manifestações, erroneamente nomeadas em muitos lugares como pró-Palestina. Não são. São pró-Hamas e pedem abertamente o assassinato de mais judeus.
É um caso em que uma minoria barulhenta e violenta clama pelo direito de não respeitar nenhuma regra democrática e consegue obrigar os demais a se curvarem à defesa da barbárie.
Paralisar uma universidade, como ocorreu em Columbia, seria algo justificável por uma questão que move a maioria dos estudantes. Só que não é o caso. O problema tem se repetido em outras universidades de elite, com Yale e Harvard.
Chegamos ao absurdo de ver estudantes impedindo estudantes judeus de entrarem no campus. Há vídeos em que assediam estudantes judeus que tentam voltar aos próprios dormitórios. Felizmente não são a maioria. Tristemente, mesmo sendo minoritários conseguem dominar o cenário da vida real e narrativa exposta na imprensa.
A Universidade de Harvard faz uma pesquisa periódica sobre as preocupações dos estudantes. Diante do caos instaurado, podemos pensar que a maioria deles está preocupada com a Faixa de Gaza. No entanto, é a 15a preocupação em ordem de grandeza. Bem acima dela, em 7o lugar, está a proteção da democracia.
É um cenário distópico. Tem ganhado mais direitos e mais poder os que querem defender uma ditadura teocrática tocada por um sanguinário grupo terrorista. Há protestos com cantos de amor ao Hamas, pedindo que sejam assassinados mais soldados de Israel e que Telaviv seja destruída. Israel é a única democracia do Oriente Médio. No entanto, o grupo majoritário que quer defender a democracia não tem o mesmo espaço dentro das universidades.
Tendemos a medir muitas questões políticas pela adesão que ganham. É uma visão míope. Questões que se tornam majoritárias ao longo da história começam a ser defendidas por grupos minoritários.
A defesa do Hamas é circunstancial. Provavelmente, a maioria que engaja nisso mal saberia apontar a Faixa de Gaza em um mapa. Só que esse pessoal tem voz, está sendo ouvido pela mídia mainstream e é capaz de moldar a cultura.
O contexto também é importante. São eufemismos para os defensores de terroristas e hipérboles para a única democracia do Oriente Médio. Eufemismos para os meus e hipérboles para os seus é uma tática bem manjada, mas ainda funciona.
Em seu estatuto, o Hamas defende o assassinato de todos os judeus pelo mundo e a extinção de Israel. Praticou atos terroristas bárbaros contra civis e fez questão de propagandear com vídeos transmitidos pela internet. Assassinatos, estupros, tortura e decapitações eram celebrados. Agora ainda resiste a devolver as dezenas de civis que mantém reféns.
Para o Hamas, o eufemismo. Estão defendendo o povo palestino, brigam por terras, querem uma solução de dois Estados. O estatuto do grupo diz ser contra qualquer solução nesse sentido, o único objetivo é destruir Israel.
Só que isso vai muito além do Hamas e do presente conflito. Se estende no tempo e no espaço. Este é mais um dos grupos jihadistas financiados e armados pela teocracia do Irã. Se há um lugar em que os direitos humanos e fundamentais andaram para trás, é ali.
Basta pesquisar fotos de Teerã antes e depois da revolução islâmica para entender qual a proposta dos aiatolás. Nem o mundo árabe, que tem conflitos históricos com Israel, apóia as ideias jihadistas da teocracia persa. No último ataque do Irã contra Israel, tanto Arábia Saudita quanto Jordânia ajudaram a interceptar mísseis e drones que cruzaram seu espaço aéreo.
Não foram ataques do Hamas, foram dos outros grupos fomentados pelo Irã, Hezbollah no Líbano e Houthis no Iêmen. Tudo começa quando Israel e Arábia Saudita estão prestes a fechar um acordo histórico e depois que Israel e Emirados Árabes fecharam um.
A batalha vai além do Oriente Médio, é a geopolítica mundial. Pelas redes sociais, China e Rússia fomentam as narrativas do Irã defendendo os jihadistas.
Isso ocorre num contexto de clara rivalização entre dois eixos. De um lado está o mundo livre, as democracias liberais. De outro estão países como Irã, China, Rússia e Coreia do Norte. A guerra é também de narrativas.
Já foi atingido o objetivo de rachar por dentro as democracias liberais. O discurso do eixo autoritário tem sido repetido por grupos minoritários no ocidente, mas com influência no mainstream, capacidade de se fazer ouvir e possibilidade de moldar a cultura.
O jogo de eufemismos contra hipérboles favorece o eixo autoritário. É feito, curiosamente, por grupos que dizem defender a democracia, os direitos humanos e as minorias. Na prática, replicam tudo aquilo que favorece autocracias, eliminação de direitos humanos e esmagamento das minorias.
Estamos diante de uma dissonância cognitiva. O grupo diz defender algo mas age no sentido diferente. Diante disso, o lógico parece ser encarar o resultado das próprias ações e mudar de atitude. Não é, no entanto, o que tende a ocorrer.
Pense em uma seita do fim do mundo. A data do apocalipse é marcada mas o mundo não acaba. O que fazem os membros? O esperado é que culpem o líder e deixem a seita. A experiência mostra o oposto, a seita tende a ser mais fortalecida e seus seguidores investem em buscar desculpas para o erro na previsão.
É assim com os supostos progressistas que defendem grupos de terroristas. Primeiro usavam eufemismos para a barbárie perpetrada pelo Hamas. Agora já pedem abertamente o assassinato de judeus. Qual será o próximo passo?
Não é difícil imaginar, é replicar todas as teses dos jihadistas e minimizar a dignidade humana e os direitos de todos os demais grupos. Ano passado, o Irã chegou a presidir um fórum de direitos humanos na ONU. O escândalo normalizado acaba corrompendo a linguagem, relativizando o que as democracias entendem por defesa de direitos humanos. É uma busca para encaixar nesse conceito o que os aiatolás praticam. Não tem como, portanto a tendência é relaxar o conceito.
Um dos principais desafios das democracias é conter os grupos que, exercendo seus direitos democráticos, pretendem implodir a própria democracia. O sucesso deles começa pela corrupção da linguagem. É assim que transformam o inaceitável em novo normal.
O fenômeno antissemita nas universidades de elite dos Estados Unidos não pode ser subestimado e precisa ser contido. Ele tem o potencial de se estender a outros grupos e minar por dentro a democracia. Comecemos por dar às coisas o nome que elas têm.
Defesa da Palestina não pode ser confundida com defesa do assassinato de judeus. Também precisa ser vista como o que é, a defesa de uma autocracia. Ninguém pode defender uma autocracia e, ao mesmo tempo, desfrutar da fama de democrata ou progressista. É um trabalho árduo, que exige constante vigilância.