Em um momento no qual muitos formadores de opinião, além de políticos e magistrados, tomam a democracia como um fim em si mesmo, e não como um simples meio para a troca pacífica dos governantes, torna-se necessário reafirmar que a verdadeira finalidade da política é o bem comum da sociedade, que deve se manifestar por intermédio da adesão aos princípios de Ordem, Liberdade e Justiça; pela promoção dos direitos inalienáveis da pessoa à vida desde a concepção, à autonomia individual dentro dos limites da lei, e à manutenção da propriedade privada; pela instauração do Estado de Direito; e, finalmente, pela vigência da economia de livre mercado. Na defesa de tais princípios, direitos e instituições, o estabelecimento do sistema representativo democrático pode ser um instrumento de extrema importância, desde que a democracia não sucumba ao fenômeno da “tirania da maioria”, tal como descrito, em 1830, pelo pensador francês Alexis de Tocqueville (1805-1859), em sua clássica obra A Democracia na América.
O cerne do problema das concepções e práticas totalitárias da democracia, propostas pelos ideólogos e pelos militantes esquerdistas, que busca eliminar a pluralidade social em nome da “tirania da maioria”, é o conflito entre noções distintas de liberdade. Ao fazer uma crítica, de modo indireto, às errôneas noções do democratismo propostas pelo filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e adotadas pelos jacobinos, durante a Revolução Francesa de 1789, o pensador e ativista político suíço Benjamin Constant de Rebecque (1767-1830), no seu famoso discurso “A Liberdade dos Antigos Comparada à Liberdade dos Modernos”, proferido, em 1819, no l’Athénée royal de Paris, defendeu que, enquanto os antigos gregos e romanos entendiam que um cidadão era livre na medida em que tinha o direito à participação direta do corpo político em assembleias populares, nas quais eram deliberadas o estabelecimento das normas legais e os rumos da ação comunitária, os modernos compreendem a liberdade como sendo a autonomia dos indivíduos em relação ao poder de intervenção do Estado na esfera privada dos membros da sociedade.
Tal distinção entre essas duas visões diversas acerca da liberdade influenciou, profundamente, as reflexões de Alexis de Tocqueville, bem como inúmeros outros teóricos liberais ou conservadores. Mesmo tendo sido a versão mais influente da diferenciação entre os dois tipos de liberdade, a tese de Benjamin Constant não era inovadora, pois foi discutida, anteriormente, nos escritos de outros pensadores. A mesma temática foi discutida pelo filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679), em 1651, no Leviatã; pelo jurista, historiador e filósofo francês Montesquieu (1689-1755), em 1748, em O Espírito das Leis; e pelo jurista e filósofo prussiano Wilhelm von Humboldt (1767-1835), em 1792, em Os limites da ação do Estado. Em sua análise pioneira, Hobbes afirmou que “a liberdade à qual se encontram tantas e tão honrosas referências nas obras de história e filosofia dos antigos gregos e romanos, assim como nos escritos e discursos dos que deles receberam todo o seu saber em matéria de política, não é a liberdade dos indivíduos, mas a liberdade do Estado”.
A mesma questão foi apresentada, mais recentemente, no livro A Constituição da Liberdade, de 1960, pelo economista, jurista e filósofo austríaco F. A. Hayek (1899-1992), quando o ilustre pensador liberal distinguiu a “liberdade política”, entendida como participação democrática, da “liberdade individual”, definida como autonomia do indivíduo, de modo que a primeira equivale à concepção antiga, enquanto a segunda à moderna. Todavia, diferentemente do que propõem os liberais em sua adesão à liberdade individual e os socialistas em sua crença na liberdade política, os conservadores entendem que há uma necessidade de equilíbrio entre as duas concepções, além de defenderem a importância da chamada “liberdade interior”, tal como apresentada pela filosofia estoica, pela tradição cristã e pelas reflexões éticas do filósofo prussiano Immanuel Kant (1724-1804), bem como uma limitação desses três tipos de liberdade pelos princípios da ordem, tanto em seu sentido interior da moral quanto no exterior da política e da justiça, nos aspectos comutativo e distributivo.
De acordo com o filósofo, historiador e literato americano Russell Kirk (1918-1994), em 1993, no livro A Política da Prudência, “o conservador procura limitar e equilibrar o poder político, de modo que a anarquia ou a tirania não tenham chances de surgir”, tendo mais adiante ressaltado que “restrições constitucionais, freios e contrapesos políticos, um cumprimento adequado das leis, a velha e intricada rede de restrições sobre a vontade e o apetite – são aprovados pelo conservador como instrumentos da liberdade e da ordem”, para, finalmente, apresentar a máxima segundo a qual “um governo justo mantém uma tensão saudável entre as pretensões da autoridade e as pretensões da liberdade”.