Arquivo da tag: Economia chinesa

Risco Chinês

O Quarto Plenário do 20º Comitê Central do Partido Comunista Chinês (PCCh), que teve início a portas fechadas no Hotel Jingxi, em Pequim, não é apenas um evento rotineiro do ciclo político nacional. É um momento de engenharia estratégica de alto risco que visa redefinir o caminho do país num cenário global crescentemente hostil. Reunindo mais de 350 dirigentes, o foco central não é a governança partidária, mas a sobrevivência econômica e segurança nacional, materializada nas propostas para o 15º Plano Quinquenal (2026-2030).

O teor central do Plenário, realizado em um momento de acentuada desaceleração econômica (com PIB abaixo das expectativas) e de colapso no investimento estrangeiro, foi a mudança brusca de prioridade: do crescimento a todo custo para segurança e autossuficiência. Sob a liderança de Xi Jinping, o Partido Comunista busca construir uma China menos vulnerável às pressões externas. 

O objetivo passa por investimentos massivos em inteligência artificial, tecnologia quântica, semicondutores e energia limpa, enquanto a modernização de indústrias tradicionais busca competitividade global. Contudo, a alocação seletiva de recursos para setores estratégicos, em detrimento de uma recuperação econômica ampla, repete os erros de planos passados, que frequentemente sacrificaram resiliência em favor de prioridades políticas. A crise da dívida local e o colapso do setor imobiliário, problemas herdados do 14º Plano, continuam a desafiar a estabilidade chinesa, e a insistência do regime em soluções centralizadas revela uma incapacidade real de promover reformas estruturais profundas, sufocando a inovação genuína.

Ao fim e ao cabo, vemos que longe da retórica de “modernização socialista”, a estratégia adotada esconde riscos sistêmicos e geopolíticos de longo prazo que merecem uma análise crítica no Brasil e no mundo. O redirecionamento massivo de crédito dos setores tradicionais (como a construção civil, em crise) para a manufatura avançada, sem um consumo interno que absorva essa produção, pode simplesmente transferir e agravar a sobrecapacidade industrial, desestabilizando os mercados globais.

Além disso, ao forçar a autossuficiência em tecnologias sensíveis, a China acelera a fragmentação dos padrões tecnológicos globais. Isso não apenas dificulta o comércio, mas também pode forçar empresas estrangeiras a escolherem entre o mercado chinês e o resto do mundo, dividindo as cadeias de valor e aumentando os custos logísticos e de produção para todos os países, incluindo o Brasil.

O comunicado final consolida diretrizes inquestionáveis, mas a visão do PCCh, ancorada em controle rígido, levanta sérias dúvidas sobre sua sustentabilidade. A centralização excessiva, que reprime vozes dissidentes e inovações não sancionadas, contrasta com a promessa de prosperidade e expõe a fragilidade de um sistema que teme a abertura. Comparado aos planos quinquenais do passado, que, apesar de falhas, beneficiaram-se de um ambiente global mais favorável, o 15º Plano enfrenta um mundo mais hostil, onde a desconfiança gerada pelo autoritarismo do PCCh mina a cooperação internacional. O custo dessa abordagem — isolamento econômico, tensões geopolíticas e erosão da coesão social interna — pode superar as ambições do regime, revelando um modelo que, sob a fachada de força, camufla profundas vulnerabilidades, aquilo que se transformou no verdadeiro risco chinês.

Instabilidade Chinesa

As notícias vindas de Pequim estão longe de serem boas. A mais recente indica forte e acentuada queda no investimento direto estrangeiro no país oriental. Este é mais um dos problemas encarados pelo governo Xi Jinping, que tem enfrentado uma sequência de crises internas recentemente e pode colocar em xeque a estratégia do regime diante de suas zonas de influência pelo mundo.

Se em 2023 o mundo assistiu a primeira queda de investimento direto estrangeiro na China em 25 anos, em 2024 este vetor acelerou, mostrando o primeiro índice negativo de IDE do país asiático em duas décadas. O movimento sugere que as empresas podem estar diversificando suas cadeias de fornecimento para reduzir riscos, porém, a suspeita é que este movimento vai além e pode indicar que os investidores estão buscando alternativas à China, inseguros com os rumos tomados pelo governo de Pequim.

Ao mesmo tempo, alguns analistas lembram que tudo isto pode indicar apenas um redirecionamento na repatriação de lucros que habitualmente eram reinvestidos. Pode ser, entretanto, todo o contexto indica algo mais preocupante, uma vez que as saídas líquidas de investimento ocorrem exatamente no momento que Pequim está tentando abrir seu setor industrial para novas captações. A sensação no mercado internacional é que a China não tem conseguido atrair capital externo, uma vez que suas políticas não têm conseguido mitigar os riscos embutidos no país.

Existem tentativas para tentar virar este jogo. O Ministério do Comércio, por exemplo, pediu aos governos locais que eliminassem políticas discriminatórias enfrentadas pelas empresas estrangeiras, numa tentativa de estabilizar a confiança dos investimentos. O resultado, entretanto, foi pífio. Ao mesmo tempo houve a recomendação para que os subsídios para veículos movidos a novas energias não se limitem às marcas nacionais. Outra medida que surtiu um efeito prático muito pequeno. Os investidores estrangeiros na verdade expressaram uma “fadiga de promessas” em meio ao ceticismo em relação aos movimentos do governo de Pequim.

Investir na China tem riscos altos. Além do plano geopolítico, as empresas também recuaram diante do aumento dos custos de produção e obstáculos de regulação. Outro problema tem sido a burocracia sobre empresas estrangeiras devido a preocupação com a segurança nacional. Fatores que prejudicam a percepção do ambiente de negócios, um tipo de confiança muito difícil de restaurar.

A falta de investimento entre as empresas globais na China pode ter efeitos de longo alcance na segunda maior economia do mundo, especialmente quando falamos de seus próprios aportes ao redor do globo, como a Nova Rota da Seda, abandonada em alguns países e redefinida depois de muitos cortes em outros. Além disso, o desequilíbrio de sua economia também afeta a capacidade de compra de comodities. Em ambos os casos a economia brasileira pode sofrer abalos significativos.

A economia chinesa enfrenta período sensível, agravada pela falta de transparência de orçamento, gestão da dívida, instabilidade no mercado financeiro e desaceleração do setor imobiliário, gerando abalo na confiança do setor privado e diminuição do volume de investimento estrangeiro. A ausência de democracia e liberdade geram instabilidade e risco. A China vem aprendendo isso da forma mais difícil.