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“Allahu Akbar ”: o grito macabro que amedronta o mundo

“Em _____, um grupo de ____homens fortemente armados e vestidos de preto entrou em um _____ em _______ e matou _____ pessoas. Os atacantes foram filmados gritando “Allahu akbar!”. Em entrevista coletiva à imprensa, o presidente _____ disse: “Condenamos esse ato criminoso de extremistas e sua tentativa de justificar seus atos violentos em nome de uma religião pacífica não terá êxito. Condenamos igualmente aqueles que queiram usar essa atrocidade como pretexto para crimes de ódio islamofóbicos”.

É assim que começa o livro Herege: Por que o Islã precisa de uma reforma imediata, da ex-muçulmana, ex-ateia e agora cristã, Ayaan Hirsi Ali. A lacuna no nome do lugar, no número de assassinos e no de vítimas deve-se à grande quantidade de casos semelhantes. O leitor pode preencher as lacunas com o caso mais recente do noticiário.

Após relembrar alguns atentados, a autora escreve que há mais de treze anos vem defendendo um argumento simples em resposta a atos terroristas como estes: “Afirmo que é tolice insistir, como fazem habitualmente nossos líderes, que os atos violentos dos islamitas radicais podem ser dissociados dos ideais religiosos que os inspiram. Temos de reconhecer que eles são movidos por uma ideologia política, uma ideologia com raízes no próprio islã, no livro santo do Alcorão e na vida e ensinamentos do profeta Maomé descritos no hadith.”

A ex-muçulmana diz, com todas as letras, aquilo que os progressistas ocidentais e seus líderes insistem em negar: “Deixo claro o meu ponto de vista nos termos mais simples possíveis: o islamismo não é uma religião pacífica.”

Na contramão das susceptibilidades multiculturalistas que se melindram com esse tipo de argumento “insensível”, Hirsi Ali expõe em seu livro “a ideia de que a violência islâmica não tem raízes em condições sociais, econômicas ou políticas — e nem mesmo em erro teológico —, e sim nos textos fundamentais do próprio islamismo.” Por defender isso, ela foi silenciada, execrada e humilhada não só por muçulmanos, mas também por alguns militantes progressistas e apologistas ocidentais do Islã.

Por inúmeras razões, parte do Ocidente está mais preparado para ser subjugado pelo Islã e padecer sob a espada de Maomé do que para aceitar essa afirmação. Prova disso é que as declarações de Hirsi Ali suscitaram críticas tão veementes que parecia ter sido ela a autora de atos de violência: “pois hoje parece ser crime falar a verdade sobre o islã”, explica Ali. “´Discurso de ódio´é o termo moderno para heresia. E no clima atual, qualquer coisa que faça os muçulmanos se sentirem incomodados é rotulada de ódio.”

Não cabe aqui nesse contexto fazer uma resenha do referido livro, o qual indico como uma leitura atual e importante. Apenas citei a sua tese inicial à guisa de introdução para comentar o último atentado que ocorreu em Paris, em 02 de dezembro, nas proximidades da torre Eiffel.

Um homem de 26 anos matou com uma faca um jovem turista germano-filipino e depois atacou mais duas pessoas com um martelo. Assim como os terroristas do Hamas ao metralharem os jovens da festa rave em Israel e assim como tantos outros terroristas, o assassino Armand Rajabpour-Miyandoab gritou Allahu Akbar antes de esfaquear sua vítima. 

Mas o nome verdadeiro do assassino não é Armand. Um documento, apresentado como extrato do diário oficial de 22 de março de 2002, contendo o decreto de naturalização de membros da família do agressor, circulou amplamente no X (antigo Twitter). Neste documento, o homem é referido como Iman Rajabpour-Miyandoab. Uma fonte policial confirmou à imprensa que o primeiro nome do terrorista foi mudado em 2003, quando ele tinha seis anos.

Iman ou Armand, é filho de iranianos, converteu-se ao Islã na juventude e já planejou um ataque terrorista em 2016, pelo qual foi condenado a cinco anos de prisão. O agressor francês de origem iraniana estava ligado a vários terroristas, incluindo os assassinos de Samuel Paty (um professor morto em 16 de outubro de 2020 perto do colégio Conflans-Sainte) e de Jacques Hamel (padre que teve a garganta cortada no dia 26 de julho de 2016, ao final de uma missa diante de três freiras e um casal de paroquianos). 

Armand também manteve contacto com um jihadista francês que partiu para a Síria e era antigo membro do grupo Forsane Alizza, célula terrorista dissolvida em 2012, que defendia a jihad armada e queria “estabelecer um califado” na França.

Nesse último atentado insere-se também o contexto da guerra Israel-Hamas. Segundo o ministro do Interior francês, Gérald Darmanin, além de gritar “Allahu akbar”, o assassino disse à polícia não tolerar mortes de muçulmanos em Gaza.

Uma reportagem do jornal Le Figaro fez um levantamento: o turista alemão morto em Paris é a 274ª vítima de um ataque islâmico, desde 2012 na França, período no qual ocorreram 26 ataques islâmicos fatais, oito deles após 2020. 

Eis a lista macabra: 


2012: 3 ataques fatais (7 mortos)
2015: 6 ataques fatais (150 mortos)
2016: 3 ataques fatais (89 mortos)
2017: 2 ataques fatais (3 mortes)
2018: 3 ataques fatais (10 mortos)
2019: 1 ataque fatal (4 mortos)
2020: 4 ataques fatais (7 mortes)
2021: 1 ataque fatal (1 morte)
2022: 1 ataque fatal (1 morte)
2023: 2 ataques fatais (2 mortes)

A mídia francesa vem, compreensivelmente, dando grande repercussão ao ocorrido. O diretor de redação do jornal Le figaro, Vincent Trémolent de Villers, escreveuem editorial de 03 de dezembro: 

“A França é um país onde existe o risco de morrer por uma facada a qualquer hora, a qualquer hora, em qualquer lugar. […] A frouxidão migratória, a desintegração cultural, a delinquência sistêmica, o jihadismo atmosférico e a fraqueza judicial estão interligados. Nesta França, o carrasco lamenta-se como vítima e a vítima, dano colateral do grande projeto multicultural, é rapidamente esquecida. Quem se lembra das jovens cujas gargantas foram cortadas há seis anos na estação Saint Charles? Ou do homem assassinado por um refugiado sudanês enquanto abria a janela em total confinamento?” 

A preocupação, porém, do coordenador do partido de extrema esquerda, La France insoumise, Manuel Bompard, não é evitar novos atentados terroristas islâmicos, mas evitar que se dê uma interpretação inadequada a eles: “Vejo claramente que, por exemplo, a questão da loucura deste indivíduo parece estar completamente retirada de questão e, no entanto, parece-me que este é um dos assuntos que terá de ser examinado após esta tragédia”, registrou o coordenador insoumise.

Para Bompard, o ataque com faca que custou a vida a um turista alemão em Paris foi apenas o ato de “uma pessoa claramente desequilibrada” para o qual não se pode “dar significado político geral.” 

Jean-Luc Mélenchon, líder do La France insoumise, também manteve suas considerações limitadas ao perfil psiquiátrico do assassino, sem mencionar as suas motivações terroristas. Tratar-se ia apenas de um homem com distúrbios psiquiátricos que interrompeu seu tratamento medicamentoso: “É hora de percebermos as consequências do colapso do sistema psiquiátrico! Cuidados, monitoramento e confinamento médico são urgentes para diminuir o dano deste tipo de pessoa”, acrescentou o três vezes candidato presidencial. 

Pouco antes do ataque o agressor, que consta na lista policial de radicalização islâmica, assumiu a responsabilidade pelo ataque evocando em um vídeo as notícias, o governo e o assassinato de muçulmanos inocentes. Na hora do assassinato ele gritou “Allahu Akbar”. Mesmo assim, uma vertente política tenta desconectar o crime da questão islâmica. 

Voltemos ao livro de Ayaan Hirsi Ali, escrito em 2015. Deixarei que ela, que conhece o islamismo muito melhor do que eu, conclua esse artigo:

“Já faz quase uma década e meia que temos políticas e pronunciamentos baseados na suposição de que o terrorismo e o extremismo podem e devem ser diferenciados do islã. Sempre na esteira de ataques terroristas em todo o mundo, líderes ocidentais apressam-se a declarar que o problema nada tem a ver com o islã propriamente dito. Porque o islamismo é uma religião pacífica. 

Mas e se essa premissa for totalmente errada? Porque não são apenas a Al-Qaeda e o EI que mostram a face violenta da fé e da prática islâmica. É também o Paquistão, onde qualquer declaração que critique o Profeta ou o islã é considerada blasfêmia e punível com a morte. É a Arábia Saudita, onde igrejas e sinagogas são proibidas, e onde a decapitação é uma forma legítima de punição, tanto assim que em agosto de 2014 houve quase uma decapitação por dia. É o Irã, onde o apedrejamento é uma punição aceitável, e os homossexuais são enforcados por seu “crime”. É Brunei, onde o sultão está reinstituindo a lei islâmica da sharia e a pena capital para a homossexualidade. […]

Atualmente ainda tentamos argumentar que a violência é obra de um punhado de extremistas lunáticos. Recorremos a metáforas médicas, tentando definir o fenômeno como algum tipo de corpo estranho no meio religioso em que ele se propaga. E fingimos acreditar que temos extremistas tão perversos quanto os jihadistas.”

Foto de Taylor Brandon na Unsplash

Israel, Hamas e o crepúsculo do Ocidente

Para mães palestinas que seguram seus filhos feridos não importa a razão de ser do ataque sofrido, para o pai que teve sua família dizimada por terroristas cruéis não importa o motivo do ataque, para os inúmeros reféns que se encontram subjugados e torturados não há barbaridade maior do que a que sofrem. Por qualquer ângulo que se olhe, o martírio de inocentes é injustificável e intolerável. O que deveria causar revolta e indignação é que se tente justificar a crueldade e a barbaridade por floreios retóricos que tomam por base uma argumentação histórica de um conflito milenar.

O mal, quando emerge sob o manto da reivindicação da justiça, é o mal dissimulado e insidioso, é o mal dos hipócritas e dos covardes. E há mal moral enraizado na mente dos que supostamente militam pela paz.

Os pacifistas que fecham os olhos para as atrocidades cometidas contra os seres humanos quando tais atrocidades ferem não aqueles cuja subjugação oferece a bandeira adequada para a sua militância doentia, mas aqueles que supostamente seriam os opressores que a sua ideologia resolveu demonizar são, na verdade, pessoas sem bussola moral, sem integridade e sem equilíbrio para lidar politicamente com uma situação tão delicada como a que o mundo agora vivencia após o atentado terrorista do Hamas.

Não basta clamar por um cessar fogo sem reconhecer que as reivindicações de Israel, como Estado atacado, são legítimas; não adianta apontar os civis mortos no ataque em Gaza sem esclarecer que tais civis são feitos de escudo pelos terroristas que se escondem nos túneis subterrâneos; não serve posar de bom-moço e pedir a paz mundial sem reconhecer que essa paz é reiteradamente ameaçada por déspotas como Vladimir Putin que hipocritamente se coloca no tabuleiro da guerra do Oriente Médio esperando a oportunidade de oferecer seu poderio bélico a todos aqueles que se alinhem à sua insânia expansionista e possam servir aos seus interesses.

Os jovens que se arvoram defensores da liberdade e da igualdade deveriam estar atentos e temerosos com a expansão autocrática contra as democracias liberais, mas, paradoxalmente, o que vemos são estudantes e professores universitários vociferando contra Israel em nome de uma abstração chamada “causa palestina”.

Qual é, afinal, a causa palestina? Quem está travando os tratados de paz senão os próprios fundamentalistas que minam todas as negociações possíveis e espalham o terror para evitar a concórdia? São os terroristas do Hamas que mantêm a população de Gaza subjugada e exposta para que o ódio recrudesça no coração de todos.

Por que a ONU não se interessou em condenar o feroz ataque perpetrado pelos terroristas antes de clamar pela paz? Por que a Assembleia Geral da ONU aprovou um projeto de resolução que pede uma pausa segundo o critério dos Estados árabes alinhados ao que há de mais retrógrado em termos de Direitos Humanos, desconsiderando a decisão coletiva das sociedades livres para as quais Israel tem o direito, senão o dever, de combater e eliminar o grupo terrorista que o atacou? O que faz com que uma instituição como a ONU, que deveria ser um ponto de dissuasão de conflitos, se torne um reprodutor de discursos hipócritas e demagógicos que não aponta com clareza o mal e que foge à responsabilidade de combatê-lo? São respostas difíceis porque talvez a ONU seja apenas o reflexo institucional de um cenário global de ambiguidade moral, de falta de critérios, de perda de prumo e de relativismo doentio.  

O secularismo, tão aclamado por progressistas e materialistas, parece ter levado ao seu oposto: a submissão ao que há de mais radical e primitivo em termos de religião. Por que o Islã não pode se curvar à política liberal do Ocidente, mas a política liberal do Ocidente precisa se curvar ao Islã? Por que o fanatismo de um povo que clama pelo extermínio dos judeus está sendo tolerado e incorporado pela cultura livre que o acolhe? O que significa a place de la République tomada por muçulmanos e simpatizantes gritando “Allah Akbar” após uma carnificina contra os judeus senão o atestado de submissão daquela que foi outrora a pátria dos Direitos do Homem e do Cidadão?

O problema é mais filosófico do que político. O iluminismo, o materialismo, o secularismo, na sua ânsia de renegar o cristianismo e seu legado moral acabou abrindo espaço para outra religião, não compatível com as leis e os costumes ocidentais. O esforço do Ocidente para trocar o cristianismo pelo ateísmo de Estado e virar as costas para sua tradição e para sua história religiosa fragilizou-o sobremaneira.

O niilismo decorrente da falta de raízes permitiu a proliferação de teorias absurdas e aberrantes tidas hoje como respeitáveis e as universidades dissolveram-se no caos do imoralismo que busca antes transgredir do que formar. Sob o nome pomposo de “decolonização”, professores militantes conseguiram fomentar um desprezo pelo que chamam de “eurocentrismo”, que nada mais é que a referência judaico-cristã da história. Movidos por ressentimento e vitimismo, exigem uma retratação em nome de uma suposta marginalização e costumam desprezar os clássicos por se acharem portadores de uma grande verdade atual. Com tudo isso, fizeram da Filosofia uma mera excrescência ideológica na qual se pavoneiam com floreios linguísticos.

Por pouco estudo que se tenha, por pouco que se conheçam os fatos, por simplória que seja a mente de um indivíduo é gritante a iniquidade que há em se justificar atrocidades em nome de uma causa política. O uso da violência no seu aspecto mais bestial não pode ser tolerado e muito menos aclamado. Os intelectuais da extrema esquerda que tratam Israel como “Estado terrorista” e o acusam de genocídio enquanto silenciam sobre a causa original da guerra em curso são ideólogos que falseiam a história.

Nesse crepúsculo do Ocidente haveremos ainda de encontrar vozes lúcidas que renegarão a perfídia. Essas vozes serão muitas vezes silenciadas e perseguidas. Mas elas ressoarão no fundo das consciências momentaneamente obnubiladas pela histeria de um mundo sem rumo e sem fé.