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Perigos da Sinodependência

Ao longo dos anos, a China se tornou o maior parceiro comercial do Brasil. A balança entre os dois países, entretanto, começou a emitir sinais de alerta, especialmente pela acentuada queda em nossas exportações e salto nas importações no último ano. Em 2024, a China representou 28,6% das nossas exportações, uma redução de 9,5% comparada a 2023, ao mesmo tempo que as importações aumentaram 19,6%.

Já alertei em diversos artigos sobre os riscos de depositarmos somente em um parceiro comercial um elevado percentual de nossas trocas internacionais, o que classifico no atual cenário, focado na China, como um claro sintoma de sinodependência. Neste contexto, nosso comércio internacional, pouco diversificado, torna o Brasil vulnerável a qualquer tipo de externalidade que possa ferir nossa economia. 

No quesito importações, é fundamental entender que tipo de produtos o Brasil vem trazendo da China. Se em um primeiro momento estávamos falando de bens duráveis e equipamentos de telecomunicações, algo mudou neste cenário. Aquilo que vimos em 2024 evidencia esta realidade, uma vez que o aumento de entradas da China veio acompanhado da importação de produtos de baixo custo no mercado brasileiro, um movimento que claramente prejudica nosso desenvolvimento industrial.

Ao contrário do Brasil, a China cerca sua economia de cuidados, diversificando parceiros, sem criar dependência de qualquer nação, algo que protege Pequim de solavancos e crises. Nenhum país possui uma fatia maior do que 9% nas importações chinesas. No Brasil, a dinâmica é a oposta, uma vez que 24,5% de tudo que importamos vem diretamente do país oriental. 

Os números de nossas trocas com Pequim precisam ser avaliados com cautela, com o objetivo de evitar um aprofundamento deste cenário onde nossas exportações caem drasticamente, na mesma medida que as importações de produtos de baixo custo e condições de produção suspeitas disparam em nosso país. Este é um modelo que já foi experimentado e rejeitado por outras nações, especialmente por ser extremamente predatório para a economia nacional. 

Vale lembrar que o avanço da relação com Pequim cobra também seus dividendos políticos. Apesar da Nova Rota da Seda não passar pelo Brasil, no último ano, ambos os países assinaram 37 acordos que podem asfaltar este processo, um caminho já abandonado por outras nações como a Itália, que assim como o Panamá, retirou-se da iniciativa por perceber que além de lucros com a infraestrutura, a conta chega com uma boa dose de submissão política. 

Atualmente 65% de nossas exportações concentram-se em apenas cinco parceiros comerciais sob a liderança inconteste de Pequim. O Brasil precisa encontrar soluções que visem evitar os riscos de uma sinodependência que fornece sinais de alerta. Precisamos evitar os exemplos de Coreia do Sul e Itália, que, ao intensificarem suas interações com a China, sofreram sérios déficits comerciais. É extremamente necessário encontrar alternativas para estarmos inseridos nas cadeias globais de comércio de forma sadia e independente, longe de qualquer dependência. 

Negócio da China

A eleição de Donald Trump levou o governo de Pequim a adotar um amplo pacote de estímulo econômico de US$ 1,4 trilhão com o objetivo de combater possíveis consequências na relação futura com os americanos. As ameaças de Trump de tarifas de até 60% sobre produtos chineses ocorrem em um momento delicado para o país oriental, que já está lidando com uma grave crise imobiliária, gastos fracos do consumidor e uma crescente dependência de exportações.

Nem tudo são flores em Pequim. Em resposta à ameaça iminente de tarifas elevadas, os formuladores de políticas chineses estabeleceram um pacote de resgate substancial. O Congresso Nacional do Povo aprovou o plano como uma contramedida para estabilizar a economia, com foco no refinanciamento da dívida e no reforço de projetos de infraestrutura para mitigar o impacto das políticas comerciais de Trump.

Apesar do estímulo, o plano alcança apenas uma fração da dívida oculta chinesa, estimada pelo Fundo Monetário Internacional em mais de US$ 8 trilhões. O retorno de Trump já impactou os mercados financeiros: as ações chinesas caíram, enquanto as ações dos EUA subiram, refletindo preocupações dos investidores sobre a escalada das tensões comerciais. A ação de Pequim com vistas a implementar o estímulo expõe sua preparação para uma rivalidade econômica prolongada.

Enquanto o presidente eleito Donald Trump se prepara para reimpor tarifas sobre a China, o líder chinês Xi Jinping busca fortalecer laços com países do porte do Brasil. A ideia de Pequim é fomentar um relacionamento construído em interesses econômicos compartilhados. Logo após a cúpula do G20 foram anunciados 37 acordos abrangendo agricultura, comércio, tecnologia e energia, que desenham um volumoso modelo de interdependência econômica.

O Brasil é o maior fornecedor de soja, minério de ferro e carne bovina da China, enquanto a China fornece ao Brasil semicondutores, fertilizantes e peças automotivas. Ficou claro que, mediante estes laços, a China busca mitigar os efeitos das tarifas dos EUA, usando o Brasil como instrumento de sua disputa comercial com os americanos.

De qualquer forma, apesar das relações profundas que desenha com Pequim, o Brasil ainda se mostra cauteloso sobre o alinhamento total com a China. Embora Xi tenha como objetivo que o Brasil se junte integralmente à Nova Rota da Seda, Lula esclareceu que seu governo não planeja integração total, mas “estabelecer sinergias entre a Iniciativa da Rota da Seda e as estratégias de desenvolvimento do Brasil”. Este movimento evidencia a estratégia global da China de aprofundar parcerias e redes comerciais para aliviar as suas próprias pressões econômicas internas.

É neste ponto que o Brasil precisa ser cauteloso, evitando a sinodependência comercial, a reedição de um novo pacto colonial e especialmente servir de contrapeso na economia chinesa em sua disputa com os americanos. Como mostram os números, a China carrega dívidas e uma situação que inspira cuidado. Atrelar nosso destino aos rumos traçados por Pequim pode se tornar um caminho perigoso, afinal, negócios da China muitas vezes escondem armadilhas difíceis de identificar.