Esse é mais um caso clássico da política brasileira: todo mundo está errado, mas cada grupo só enxerga o erro do outro. Não há inocentes na história. E talvez essa seja a lição mais importante.
A começar por quem elege esse tipo de figura. Depois do primeiro mandato de Carla Zambelli, qualquer adulto que tenha assistido à atuação dela e decidido reconduzi-la ao cargo merece, no mínimo, uma temporada de reflexão. A instabilidade emocional, a inexperiência e a completa falta de decoro estavam todas lá. A escolha foi consciente.
A política brasileira não chegou ao fundo do poço só por causa de políticos oportunistas. Chegou porque o eleitor insiste em dar palco ao pior tipo de performance. É como em um relacionamento abusivo: quanto maior a palhaçada, mais a vítima se apega. O sujeito mente, grita, trai, humilha. E o outro responde com mais defesa, mais amor, mais justificativa. Na política, o roteiro é o mesmo.
O eleitor brasileiro se comporta como quem saiu de um relacionamento com alguém decente, educado, trabalhador, mas se frustrou. Foi traído, foi enganado, sofreu. E então decide que agora só vai se envolver com o chefe do tráfico. Porque “esse aí pelo menos é verdadeiro”. Acha que gritar é sinceridade, que humilhar é autenticidade, que ser ignorante é uma forma de pureza. É uma inversão completa dos critérios de valor.
Depois de se decepcionar com a política institucional, seja a esquerda engomada ou a direita de gabinete, o brasileiro médio passou a acreditar que a solução viria de gente sem filtro, sem preparo e sem freio. Elege figuras histriônicas, descontroladas, violentas, achando que assim finalmente será respeitado. Não será. Mas repete o padrão como quem insiste em relacionamentos ruins esperando um final feliz.
Aí surge o caso Zambelli. Um enredo que mistura roteiro de série ruim com delírio institucional. A deputada se envolve com o hacker da Vaza Jato, o mesmo que implodiu a Lava Jato, e vira protagonista de mais uma crise mal explicada. Paga com dinheiro público para que ele invada sistemas do Judiciário. Arriscou causar instabilidade em processos, que são só eletrônicos agora, envolvendo todos os brasileiros. O dever dela, como deputada, seria reportar qualquer risco de invasão.
O caso de Zambelli também levanta uma questão institucional importante. Ela foi julgada por uma turma do Supremo, e não pelo plenário. Isso está errado. Zambelli é deputada federal em exercício, com mandato vigente. Um julgamento com esse impacto político e institucional não pode acontecer fora do pleno. Essa distorção precisa ser debatida politicamente. O problema não está na figura da parlamentar, mas no precedente que se abre quando o rito é atropelado. Quando a regra deixa de valer para quem está errado, ela deixa de valer para todo mundo.
Não se trata de defender Zambelli. Trata-se de defender a institucionalidade. Quando o processo se adapta ao réu, e não o contrário, o risco é de que as regras deixem de valer para todos.
Esse caso é um retrato do nosso tempo. A política virou uma guerra de torcida organizada, movida a gritos e reações emocionais. E do emocionado na política já se sabe duas coisas: não entende nada de política e os frutos daquela árvore costumam ser podres. Quem topa comer, que arque com as consequências.
A política brasileira virou isso. Um espetáculo em que os protagonistas não sabem atuar e o público aplaude a pior cena.
Cenas dos próximos capítulos virão. Zambelli pode ser cassada. Pode continuar no cargo. Pode sair do país para dar curso sobre democracia. Nada disso surpreende mais.
Mas o que fica, para quem quiser aprender, é o seguinte: se você continua defendendo o que já te fez mal, o problema não é mais do outro. É seu.