Arquivo da tag: Ronald Reagan

Tarifas e Oportunidades

“Tarifas podem funcionar por um curto período, entretanto o que invariavelmente ocorre é que as indústrias nacionais começam a depender desta proteção do governo. Ao mesmo tempo, param de competir e investir em inovação e gestão tecnológicas. Além disso, a adoção de tarifas leva inevitavelmente à retaliação de países estrangeiros e ao desencadeamento de guerras comerciais. O resultado é devastador: cada vez menos concorrência e barreiras comerciais cada vez maiores. Tarifas subsidiam a ineficiência e a má gestão e as pessoas param de comprar por causa dos preços artificialmente altos. Então o pior acontece: os mercados encolhem e entram em colapso, empresas e indústrias fecham e milhões de pessoas perdem seus empregos”.

A passagem acima é o trecho de um discurso do Presidente Ronald Reagan sobre tarifas, suas consequências e a lógica econômica deste tipo de decisão. Sua adoção afeta de forma direta a liberdade econômica e o livre mercado, tornando as nações reféns de ajuda governamental, inibindo a inovação e modernização da gestão, criando reservas de mercado, menos concorrência, e ao final, uma crescente onda de desemprego. 

Este é o caminho que o Brasil optou ao longo dos anos, aquele responsável por financiar a ineficiência e o atraso, jogando o país em uma espiral de altos custos, qualidade baixa, produtos ineficientes, mão-de-obra pouco qualificada e uma nação com economia decadente. Ainda lembramos com clareza da famigerada reserva de mercado na área de informática, uma decisão que impõe até os dias de hoje suas consequências em nosso cotidiano. Como disse à época o economista Roberto Campos em tom profético, “o Brasil nunca perde a oportunidade de perder uma oportunidade”. Ele estava certo.

Ao adotar uma política de alta de tarifas, o governo Trump surge trilhando um caminho antagônico daquele percorrido pelo seu país ao longo do último século. Ao defender os mecanismos do livre-comércio, os americanos foram responsáveis por liderar o século mais importante em termos de prosperidade baseado na abertura dos mercados e suas relações comerciais como o sustentáculo de democracias capazes de prover estabilidade alicerçada em um mercado livre e cadeias globais de valor interdependentes. 

Surpreende, entretanto, que países como o Brasil, que optaram pelo triste caminho do protecionismo ao longo da história, façam agora, de forma conveniente, a defesa de uma política de livre-comércio que jamais adotaram em relação a sua própria economia. Mais do que isso, ao aprovar no parlamento a chamada “Lei da Reciprocidade”, que autoriza o governo a retaliar com aumento de tarifas esta guerra comercial, percebemos que pouco aprendemos sobre os mecanismos da economia global.

O movimento mais inteligente, entretanto, seria fazer o oposto. Ao invés de dobrar a aposta, o Brasil deveria derrubar suas tarifas, abrindo o país para um mundo de oportunidades e concorrência, algo que faria um bem enorme para nossas empresas e nossa população. Taiwan, um exemplo de inteligência comercial, optou por este caminho, começando a negociação por ‘tarifas zero’ bilaterais, aumentando inclusive as importações dos EUA. A expressão usada por seu Presidente, William Lai, é inspiradora: “prosperidade compartilhada”.

Toda crise oferece oportunidades. O Brasil tem diante de si mais uma chance de provar que a famosa frase do economista Roberto Campos faz parte de nosso passado.

Trump e a doutrina da ferocidade com propósito

A posse de Donald Trump na tarde desta segunda-feira (20) marca uma mudança completa no desenho político dos Estados Unidos. Ele retorna ao poder anabolizado por uma contundente vitória eleitoral num contexto que, 4 anos atrás, era tido como impossível. Havia, afinal, perdido a reeleição para Joe Biden. Mas, ao contrário do que poderia se supor (e do que desejavam seus inimigos), não aceitou a resignação, e desde o primeiro dia trabalhou na construção de uma volta por cima. Mas talvez nem ele imaginasse que seu retorno seria tão triunfal. O maior da história do país.

O novo presidente americano não venceu apenas no voto popular e no Colégio Eleitoral. Fez maioria da Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Seu partido também elegeu a maior parte dos governadores e dos representantes dos legislativos estaduais. É o que na América se chama de landslide. Os republicanos não tinham um desempenho desses desde Ronald Reagan e sua primavera conservadora, lá nos anos de 1980.

Antes mesmo de assumir, Trump já trazia a reboque duas vitórias políticas, ambas de impacto global. A primeira delas, a mudança na política de moderação de conteúdos da Meta, big tech de propriedade do bilionário Mark Zuckerberg. “Assinarei um decreto para imediatamente por fim à censura governamental e trazer de volta a liberdade de expressão para a América”, disse depois de empossado e no mesmo recinto em que estavam Zuckerberg e outros magnatas das novas tecnologias.

Enquanto tomava posse no Capitólio, outro feito prévio de Trump se concretizava no Oriente Médio, com o cessar-fogo costurado entre o grupo terrorista Hamas e o Estado de Israel viabilizava a entrega dos reféns retidos em Gaza desde meados de 2023. A costura geopolítica, envolvendo autoridades árabes e o governo de Benjamin Netanyahu, só se concretizou pela ação firme do novo governo americano. A negociação, é verdade, já vinha desde de maio, mas não chegava a uma conclusão exatamente porque Joe Biden não era respeitado e nem temido. Disposto a obter um resultado antes de começar o mandato, Trump despachou para a região o empresário Steve Witkoff. A aposta foi certeira.

Trump não é um leitor voraz de ciência política e de filosofia. Não é capaz, por exemplo, de fazer uma análise da história de seu próprio partido ou de quais pensadores influenciaram na sua formação. É um empresário que negocia com a faca nos dentes e pensa permanentemente na obtenção de resultados. É a doutrina da ferocidade com propósito. Essa é a linha de ação será devolvida para a Casa Branca. É tolo, portanto, especular em tom de dúvidas sobre como Trump governará os EUA. Ele já ocupou o posto.

Já no primeiro dia de governo, o novo presidente assinou dezenas de decretos reposicionando os EUA no cenário global. Também distribuiu recados e deixou claro que usará todo o poderio militar e econômico norte-americano para alcançar seus objetivos internos e geopolíticos. A diferença é que agora, muito diferente de 2016, quando chegou ao poder pela primeira vez, Trump sabe onde está e como fazer.