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Investimentos Transparentes

No último ano, o Brasil perdeu dois pontos no Índice de Percepção da Corrupção e caiu 10 posições, terminando na 104ª colocação entre os 180 países avaliados. Estamos abaixo da média global, da média regional para Américas, da média dos BRICS e ainda mais distante da média dos países do G20 e da OCDE. Isto afeta o Brasil em diversas frentes, entretanto, cria travas para algo essencial, que é a busca de investimentos limpos, não predatórios e de qualidade para impulsionar nossa economia.

Ao ocupar a presidência do G20 neste ano, nosso país está buscando intercâmbios de experiências com outras nações sobre formas efetivas de combater a corrupção, o que é uma ótima notícia, uma vez que o brasileiro trabalha cerca de um mês por ano apenas para pagar a conta dos desvios de dinheiro público, ou seja, 8% de tudo que é arrecadado em impostos no país. Nesta semana, o G20 discute estes mecanismos na esperança de que seus membros possam internalizar boas práticas.

Apesar do Brasil não ser exemplo no combate à corrupção, especialmente depois do desmonte da Operação Lava Jato, percebemos que existem iniciativas interessantes que, se bem aplicadas e com desdobramentos efetivos no judiciário, podem ajudar o país no combate ao crime. A mais nova iniciativa é o uso da inteligência artificial como instrumento efetivo que pode apontar desvios já em seu nascedouro. A Controladoria-Geral da União já trilha este caminho por intermédio de uma ferramenta chamada Alice.

Alice, acrônimo de Analisador de Licitações, Contratos e Editais, é uma ferramenta desenvolvida pela CGU que analisa, de forma automatizada, processos de compras e contratações públicas. Diante de potenciais riscos e inconsistências, dispara alertas para que seja possível atuar de forma preventiva e tempestiva em processos licitatórios. Esta é uma das inovações que o governo brasileiro leva esta semana na preparatória do G20.

Sabemos que combater a corrupção reduz desigualdades, fortalece instituições e a democracia, além de tornar o país mais atraente para investidores internacionais. Não há notícia de nação que tenha conseguido atrair capitais de qualidade no mercado externo sem possuir instrumentos eficazes contra a corrupção e o capital predatório. Atualmente, segundo a Transparência Internacional, a capacidade do Brasil combater a corrupção se mantém em um equilíbrio frágil, “um modelo que sempre pode ser desconstruído em poucos anos”, como vimos com a Operação Lava Jato.

O resultado está exposto em nossos números. O IDP (investimento direto no país) foi de US$ 3 bilhões no mês passado –queda de 30,6% em relação ao mesmo mês de 2023. O saldo do investimento direto no país ficou abaixo do esperado pelo mercado financeiro, um resultado que demonstra o quanto ainda precisamos melhorar.

Fato é que nossa economia depende diretamente da capacidade do país responder de forma firme contra a corrupção. Investimentos limpos e de qualidade somente chegarão depois de introduzirmos mecanismos de avaliação e verificação, como forma de evitar que capitais sujos usem nossa economia como lavanderia, além de regras claras e penas severas aos corruptos. Se o Brasil deseja sair desta espiral de atraso é fundamental que o combate à corrupção e o respeito às leis se tornem regra e deixem de ser apenas uma utopia ilusória. Nossa presidência no G20 pode se tornar um importante passo nesta direção.

Lições de Pequim

O giro de Geraldo Alckmin pelo Oriente tem como objetivo estreitar o relacionamento com os chineses e sauditas com foco em buscar investimentos estrangeiros para o país.  Ele faz um movimento correto, algo sabidamente necessário para nossa economia, carente de recursos e refém de um déficit de poupança interna que torna praticamente mandatória a busca por investimentos internacionais.

Atualmente 65% de nossas exportações concentraram-se em apenas cinco parceiros comerciais: China, União Europeia, Estados Unidos, Mercosul e Japão. Se considerarmos apenas a China, o percentual é de 29%, tornando o país oriental o principal parceiro comercial do Brasil. Uma realidade que gera ganhos no curto prazo e preocupações no longo, uma vez que a excessiva dependência exportadora para somente um país gera incerteza e insegurança dentro da economia.

Ao contrário do Brasil, a China cerca sua economia de cuidados, diversificando parceiros, sem criar dependência de qualquer nação, algo que protege Pequim de solavancos e crises. Nenhum país possui uma fatia maior do que 9% nas importações chinesas e no tocante ao percentual exportado, o principal parceiro são os americanos, com cerca de 16%, seguidos por Japão e Coreia do Sul com pouco menos de 5%. Uma forma hábil de evitar dependências excessivas, blindando a economia por meio da diversificação.

Para além disso, a China controla também o fluxo de investimento estrangeiro por meio da avaliação criteriosa da origem e objetivos dos recursos que aportam no país. Pequim é uma das nações que possui um sistema de avaliação dos investimentos externos, um mecanismo que se tornou um importante instrumento de defesa contra aquisições de caráter predatório e entrada de capitais sem origem comprovada.

Para além dos investimentos chineses no Brasil, deveríamos nos atentar também sobre os modelos adotados por Pequim para blindar sua economia, instrumentos e atitudes que poderiam ser implementados pelo nosso país. Não há dúvidas que um sistema forte, blindado e confiável tornaria o Brasil ainda mais atrativo para chegada de investimentos de qualidade, evitando a entrada de recursos de origem duvidosa que podem, ao fim e ao cabo, enfraquecer nossa economia e afetar a soberania em setores estratégicos.

A diversificação é outra lição que devemos aprender com os chineses. Evitar qualquer tipo de dependência comercial é um caminho virtuoso que devemos buscar. Para isso devemos diversificar nossa economia e buscar acordos e novos parceiros comerciais que nos deixem menos vulneráveis nas cadeias globais de comércio. Desta forma, qualquer tipo de instabilidade internacional teria menor potencial de atingir nossas exportações. É um caminho inteligente tomado pela China, mas também pelos Estados Unidos, Japão e União Europeia. É provável que além de investimentos, Alckmin retorne do Oriente com impressões e leituras atentas sobre o modelo de verificação na atração de recursos e a necessidade de diversificação para um modelo econômico sadio. Temos muito a aprender com Pequim neste tema. O potencial do Brasil é imenso, porém devemos estar atentos para evitar que nossos ativos em comunicação, dados, energia e transportes se tornem bens vulneráveis em um mundo onde recursos predatórios e capitais sujos circulam em busca de porto seguro.

Aliança Franco-Brasileira

A visita de Emmanuel Macron ao Brasil é importante em termos econômicos e simbólica em termos políticos, uma vez que a França possui laços estratégicos e profundas ligações econômicas com nosso país. Isto explica por que as agendas estão além das diferenças, focando em parcerias essenciais para fortalecer os laços entre nações democráticas e economias complementares como na área ambiental, política industrial, energia verde, transição energética, além das relações econômicas e financeiras tradicionais.

Pelo critério de controlador final, a França ocupa a posição de 3º maior investidor no Brasil, com cerca de US$ 38 bilhões investidos. Em 2023, a corrente de comércio bilateral alcançou US$ 8,4 bilhões. Estamos falando de um parceiro essencial para os fluxos de comércio exterior brasileiro, além de uma nação com peso econômico fundamental nas cadeias globais de valor.

Dentro do contexto da União Europeia esta importância se multiplica, uma vez que o bloco é o investidor estrangeiro mais importante do país, aportando mais de dez vezes aquilo que os chineses vêm trazendo de capital externo ao Brasil. Enquanto a China é hábil em divulgar seus aportes, os europeus, até pelo caráter difuso multinacional, têm menos reconhecimento quando o assunto é o seu investimento direto estrangeiro.

O acordo entre Mercosul e União Europeia, emperrado nos últimos tempos, exatamente diante da dificuldade de avançar em temas protecionistas em ambos os lados, por certo está longe de atingir um denominador comum. Porém, os europeus, seja como bloco e até mesmo por iniciativa de seus próprios países, tem buscado forma de se proteger dos investimentos estrangeiros predatórios. Um tema que poderia servir de inspiração aos países do Mercosul, algo que deixaria os países do bloco menos expostos em sua soberania diante do brutal avanço de aquisição estrangeira de ativos estratégicos por países que estão fora da união aduaneira.

Alianças comerciais e políticas com países como a França são essenciais para fortalecer nossa economia e democracia, uma vez que estamos lidando com um país democrático, com instituições e moeda estáveis, judiciário independente, regras definidas e contas públicas equilibradas. Um conjunto de fatores virtuosos para fluxos comerciais perenes e saudáveis que estimulam investimentos, dinamizam a economia e geram empregos.

Isto fica muito claro no fluxo atual que precisa ser ampliado. No Brasil já estão presentes mais de 850 empresas francesas, o que torna o país europeu o maior empregador estrangeiro em território nacional, com a geração de 500 mil empregos. A trilha é simples. Com um potencial gigantesco, uma parceria desenhada com habilidade pode impulsionar as economias de ambos os países. Há muito espaço para crescer.

O Brasil deveria privilegiar relações saudáveis com países com confiável histórico de relacionamento como possuímos com a França ao invés de se submeter aos interesses e recursos predatórios de autocracias como vem acontecendo em tempos recentes. Esta visita serve como lançamento destas iniciativas e uma reaproximação profícua de parceiros tradicionais capazes de trabalhar sistemas de parceria, investimento e integração econômica. Afinal, como sempre digo, democracias gostam democracias.

Alerta Transparente

Nos útimos anos o Brasil viveu enormes retrocessos que começam a aparecer em rankings internacionais. O mais recente é o Índice de Percepção da Corrupção produzido pela Transparência Internacional. Nosso país caiu 10 posições e agora é considerado o 104º país mais corrupto do mundo com nota 36 de uma escala que vai de zero (mais corrupto) a 100 (mais íntegro).

O Índice de Percepção da Corrupção é o principal indicador de corrupção no mundo. Produzido pela Transparência Internacional desde 1995, avalia 180 países e territórios. Como parâmetro, o Brasil está abaixo da média global de 43 pontos, abaixo da média regional para Américas (também de 43 pontos) e inclusive abaixo da média dos países que compõe a formação original do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) com 40 pontos. A comparação se torna incômoda sob qualquer aspecto.

A situação fica ainda mais constrangedora quando é realizada com integrantes do G20, composto pelas 19 principais economias do mundo, mais a União Africana e a União Europeia, com 53 pontos e com membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE) com 66 pontos. Isto significa que quanto mais a comparação leva em conta países democráticos e desenvolvidos, a distância aumenta.

Quando olhamos para o Brasil, a Transparência Internacional manteve distância da polarização política nacional, apontando tanto o governo Bolsonaro, quanto o atual governo Lula, como despreparados a lidar com o tema. Segundo o Índice, os anos em que Bolsonaro esteve na Presidência da República, entre 2019 e 2022, deixaram a lição de como, em um curto período, os marcos legais e institucionais anticorrupção, que levaram décadas para ser construídos, podem ser destruídos, com reflexos negativos claros em nossa democracia.

O primeiro ano de Lula deixa a lição de como é ou ainda será desafiador o processo de reestruturação. O Índice de Percepção da Corrupção avalia três linhas de defesa contra a corrupção, nas áreas judicial, política e social e destaca a situação crítica do controle jurídico da corrupção por causa da falta de independência do sistema de Justiça. Desmonte de operações, anulação de provas e a inobservância da lista tríplice em indicações ao judiciário também mostraram que as instituições brasileiras retrocederam em manter pilares republicanos independentes.

Para além disso, é apontado que a declaração de inconstitucionalidade do orçamento secreto “não impediu o Congresso e o governo Lula de encontrarem rapidamente um arranjo que preservasse o mecanismo espúrio de barganha, que manteve vivos velhos vícios aperfeiçoados durante a gestão Bolsonaro”. Na visão do organismo, independente do governo, os mecanismos políticos que alimentam corrupção e falta de transparência permanecem intocados e resultam na piora do índice brasileiro.

Ao nos nivelar com autocracias do BRICS e nos afastarmos da boa governança de países democráticos da OCDE, o Brasil faz uma opção equivocada que se reflete nos índices internacionais. Isto afeta os investimentos estrangeiros, estabilidade institucional e o fortalecimento de nossa democracia. O aviso da Transparência Internacional deveria servir de alerta. Retroceder é um péssimo caminho para nosso país.

Inteligência Comercial

A China se tornou ao longo dos anos o principal destino das exportações brasileiras e um parceiro econômico importante do Brasil, assim como de diversos outros países pelo mundo. Isso ocorreu em especial nos países menos industrializados, dependentes da exportação de commodities, consumidos em grande quantidade por Pequim. Porém, para além dos ganhos comerciais com o oriente, o Brasil deve se perguntar até que ponto é prudente ser dependente em demasia da sede chinesa. A prudência nos orienta sempre a diversificar e, por conseguinte, atender diversos mercados, protegendo nossos interesses e nossos produtores.   

Nesta esteira, o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem defendido uma posição inteligente no que diz respeito ao assunto. Recentemente disse que, sem prejuízo da relação comercial criada com a China, o Brasil não pode prescindir de uma relação bilateral com os Estados Unidos. Para além disso, completo que também devemos mirar na União Europeia, mantendo canais sadios de diálogo comercial com os três atores. 

Estamos diante de um acordo histórico com a União Europeia, algo que será muito benéfico para a economia brasileira, aumentando nosso fluxo comercial com o velho continente. Ao mesmo tempo, isso terá impacto nas cadeias globais de valor, o que fará o Brasil crescer como player relevante nas negociações com outros blocos e nações, afinal, com alcance maior de mercado, iremos adquirir maior influência e importância.

Em Washington, o caminho também está aberto. Depois de crescerem 45% em 2021, as exportações brasileiras para os Estados Unidos cresceram 20% em 2022, passando de US$ 31 bilhões para US$ 37,4 bilhões, batendo o recorde de mais de US$ 70 bilhões em trocas comerciais entre os dois países.

Considerando que somos um país com forte déficit de poupança interna, que precisa de capital externo para realizar investimentos, vale lembrar que os americanos aportaram US$ 200,1 bilhões no Brasil em 2021, ou 22,2% do valor total investido no país. A China, apesar de ser um parceiro comercial relevante, investiu no mesmo período apenas US$ 49,7 bilhões, uma fatia de modestos 5,5%. A Europa foi além e investiu US$ 566,9 bilhões no Brasil.

As vantagens comparativas em lidar com a União Europeia e Estados Unidos são claras, afinal, estamos lidando com países democráticos, com instituições estáveis, judiciário independente e regras definidas. Para os fluxos de comércio constantes e longos, pilares como estes são essenciais, pois fornecem segurança e manutenção das regras, elementos centrais para fluxos comerciais saudáveis e sólidos.

Sem prejuízo das relações construídas com a China, o Brasil deve mirar na diversificação de parceiros comerciais e apostar em blocos e nações com quem dividimos identidade e valores, fatores que facilitam muito as negociações e os fluxos comerciais nas cadeias de valor. O caminho aberto de uma relação bilateral saudável com os Estados Unidos e a finalização dos detalhes do acordo com a União Europeia podem trazer este equilíbrio necessário, tanto na frente comercial, como no ambiente político internacional, posicionando o Brasil como uma importante peça no xadrez global.