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Defesa de Maduro e a demência fanática da extrema esquerda

A eleição presidencial já não é mais a questão central no drama atual da Venezuela, dado que a fraude já se consumou. O episódio de 28 de julho tornou-se pano de fundo catalisador nos discursos de mobilização das partes em luta: de um lado, o povo lutando por liberdade e democracia; do outro, a repressão de uma ditadura cujo objetivo é aquele de todas as tiranias: manter-se no poder.

A repressão de Maduro avança no prometido “banho de sangue”, assassinando dezenas de cidadãos. O ditador inflama seus sequazes bradando que já prendeu mais de 2 mil opositores e prenderá outros mais, enviando-os para prisões de segurança máxima (onde são praticadas torturas).

A sacrificada luta do povo venezuelano impõe-se como objeto de maior preocupação dos países democráticos de todo o mundo e à consciência das pessoas que sinceramente defendem a liberdade e os direitos humanos. Não é o caso do presidente do Brasil, nem dos seus assessores internacionais, nem do seu partido.

Internacionalmente, cresce a repulsa democrática, humanista e civilizatória a uma ditadura assassina, fraudulenta, mentirosa, corrupta e bizarra que é esta do ditador Nicolás Maduro. Inúmeros países já reconhecem Edmundo Gonzáles como o legítimo vencedor das eleições na Venezuela. Vergonhosamente, o Brasil não está entre eles.

É bem verdade que há certa pressão da imprensa, de políticos e da sociedade civil para que Lula não escancare de vez sua índole autoritária e devolva o Brasil aos trilhos da civilização, dando um passo atrás na sua diplomacia do mal. Não menos verdade, porém, é que há uma pressão do lado oposto.

A esquerda fanática

Mario Vitor Santos, por exemplo – que já foi ombudsman da Folha e hoje é colunista e apresentador de um site desprezível cujo nome nem convém citar – escreveu o espantoso texto “Maduro, não entregue as atas.”

Dirigindo-se retoricamente ao tirano da Venezuela como “presidente” que acabou de ter uma “vitória consagradora”, o militante escreve que “alguns inimigos inexplicavelmente inclusive o Brasil, se juntaram a seus arquinimigos para humilhá-lo e a seu povo”.

O patético texto foi pinçado aleatoriamente como uma amostra do grau de retração intelectual ao qual a mentalidade de certa parte da esquerda está submetida.

Mario Vitor acha que a cumplicidade do governo Lula com a ditadura de Maduro é de pouca monta e exige uma entrega total aos caprichos do ditador. Ele é a espécime de um tipo. Um tipo fanático, intolerante, autoritário e liberticida.

Ao permitir a nota do PT parabenizando Nicolás Maduro pela sua vitória, Lula estava testando a força dessa ala mais radical e extrema; ao declarar cinicamente que o pleito eleitoral na Venezuela foi “teoricamente pacífico”, um processo que “não tem nada de grave, nada de assustador”, Lula estava testando até que ponto ele pode continuar tratando os brasileiros como idiotas.

Como Lula não é burro, já deve ter percebido que não será tão fácil quanto ele esperava construir uma narrativa por meio da qual Nicolás Maduro se mantenha no poder sem que isso implique para ele (Lula) uma grande perda de popularidade.

Não é pragmatismo; é cumplicidade cínica

Muitas vozes da esquerda já se levantaram contra Maduro e sua fraude eleitoral. Até mesmo alguns lulopetistas notórios repeliram Maduro abertamente. Tudo isso é bem-vindo porque torcemos pelo aumento da pressão contra o ditador, venha ela de onde vier.

É preciso, porém, perceber as nuances da forma como a crítica contra Maduro está sendo apresentada pela esquerda. Como bem disse o jornalista Rodolfo Borges, em recente artigo em O Antagonista, o “governo Lula não é mediador na Venezuela, é cúmplice.”

Isso deveria estar óbvio, mas chama atenção os vários artigos que circularam nos quais se tenta passar a ideia de que a diplomacia do Brasil, em relação à Venezuela, estaria sendo prudente e pragmática.

Na análise da jornalista Eliane Cantanhêde, para citar um exemplo, Lula, Celso Amorim e Mauro Vieira sabem que Maduro perdeu a eleição e conversam sobre isso a portas fechadas, mas a portas abertas “é preciso manter a frieza e aguentar firme a pancadaria interna para buscar soluções.”

Para Cantanhêde, esses homens virtuosos “estão agindo com cautela e estratégia para não romper pontes com Maduro”. Segundo ela, eles estariam muito preocupados em evitar o prometido banho de sangue ou um golpe militar. Como se ambas as coisas já não tivessem acontecido! Como se o país já não fosse há anos uma ditadura militar e como se o banho de sangue já não estivesse em curso.

Em um artigo posterior ao acima citado, Cantanhêde continua batendo na mesma tecla: o Brasil aliou-se a México e Colômbia “para manter o diálogo” com a ditadura venezuelana com “o sonho de chamar Maduro à razão”.

A jornalista reconhece a inegável fraude, a “coragem impressionante” dos oposicionistas e a loucura autoritária de Maduro, mas insiste em colar no governo Lula uma boa intenção que claramente não existe.

A intenção do PT, de Celso Amorim e de Lula sempre foi garantir a perpetuação do poder de Nicolás Maduro e criar justificativas que tornassem essa ignomínia um pouco menos indigesta aos eleitores brasileiros.

A tese da colunista de que Maduro fez “todo mundo de bobo” não é apenas infantil, é também perniciosa porque escamoteia a verdade e tenta manter na cara de Lula a máscara de democrata e humanista que o mundo todo está vendo cair.

Espero, realmente, que o governo brasileiro não se deixe arrastar pelo surto de demência fanática da extrema-esquerda, saia das cordas do acovardamento diplomático e venha a cumprir o papel que pode cumprir na transição de poder de Maduro para a oposição vitoriosa.

Espero isso porque torço pela libertação da Venezuela e porque acredito no instinto de sobrevivência do animal político Lula e não porque acredito nas suas boas intenções em relação a um povo que ele mesmo ajudou a escravizar.

Más Companhias

Os tentáculos do Kremlin finalmente alcançaram Alexei Navalny, principal opositor de Putin, preso em uma penitenciária em Yamalo-Nenets, no círculo polar ártico. Navalny agora faz parte de uma lista cada vez mais extensa de opositores do regime de Putin que foram vítimas de assassinatos, envenenamentos, emboscadas e supostos acidentes. Isso tudo acontece na mesma medida que as liberdades são cerceadas e o regime se fecha cada vez mais sob um domínio autoritário e despótico.

A Rússia é uma das principais forças por trás de um movimento autocrático crescente no mundo, com foco em especial no desmonte das democracias ocidentais. Falo de uma estratégia que está além da direita e esquerda tradicionais, que atualmente ocupam a arena política. O movimento autocrático une estes dois polos naquilo que ambos têm de pior, que é o desprezo pelo modelo de democracia liberal construído nos pós-guerra.

Venho repetindo há algum tempo que as placas tectônicas da estabilidade internacional vêm se movimentando com especial intensidade em tempos recentes com a ascensão do modelo chinês, teocracismo iraniano, bolivarianismo venezuelano, autoritarismo russo e todos os subtipos derivados destes modelos. A união destas forças por meio da economia e pela manipulação da democracia são os principais desafios enfrentados por um mundo que se encontra carente de líderes e estadistas.

Em termos de Brasil, tudo indica uma captura da política pela lógica destes novos players do cenário internacional, seja pela via da direita ou da esquerda, com vimos em tempos recentes. A presença do nosso país no BRICS, principal arena do grupo, chancela o Brasil como membro ativo de um clube que além de China, Rússia, África do Sul e Índia, agora conta com Arábia Saudita, Irã, Egito, Etiópia e Emirados Árabes Unidos. Uma opção que deixou de considerar a democracia como elemento essencial.

Fato é que as posições recentes de nossa diplomacia deixam claro o caminho tomado, afinal no governo passado deixamos de condenar a invasão da Ucrânia, posição mantida atualmente. Da mesma forma, deixamos de condenar as violações aos Direitos Humanos na Nicarágua e Venezuela, além de golpes de estado na África sabidamente organizados com o apoio de Moscou. Falta também condenar as brutais violações ocorridas na China, especialmente a brutalidade contra a minoria uigur.

Estamos diante de uma lógica perversa, que privilegia alianças políticas em detrimento de valores universais, enterrados aos poucos pelos sócios de nosso país no BRICS e por todos os outros satélites que resolveram optar pela cartilha autocrática. Estamos diante da construção de uma nova ordem internacional por nações que desprezam os valores da liberdade e da democracia. Uma nova ordem pela qual o Brasil, de forma equivocada, ingênua e irresponsável, vem optando por fazer parte.

A morte de Alexei Navalny é mais um capítulo triste da história da Rússia. Ele se junta a Alexander Litvinenko, Anna Politkovskaya, Natalia Estemirova, Stanislav Markelov, Boris Nemtsov, Sergei Yushenkov, Denis Voronenkov, Sergei e Yulia Skripal, Nikolai Glushkov e tantos outros opositores que pereceram ao enfrentar o Kremlin de Putin. O Brasil deveria repensar suas alianças e permanecer ao lado de democracias liberais e livres, antes que sejamos ainda mais contaminados pelas más companhias.

Foto: Ricardo Stuckert

Brasil: diplomacia humanista ou aliança com o mal?

Desde a retumbante vitória de Maria Corina Machado nas eleições primárias da oposição na Venezuela, Maduro recrudesceu ainda mais seu já ditatorial regime com cassação de direitos políticos dos opositores e prisões arbitrárias. No arroubo autoritário mais recente, o ditador mandou prender a ativista de direitos humanos Rocío San Miguel em uma prisão chamada El Helicoide, considerado o maior centro de tortura do chavismo, e expulsou da Venezuela os funcionários do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos por terem criticado a prisão e exigido a libertação da presa política.

Diante do grave ocorrido, os países latino-americanos Argentina, Equador, Paraguai, Uruguai e Costa Rica assinaram nota conjunta expressando “profunda preocupação” pela “detenção arbitrária da ativista de direitos humanos Rocío San Miguel” na Venezuela e exigindo sua libertação imediata. Da mesma forma rechaçaram as medidas de contra o Gabinete de Assessoria Técnica do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos na Venezuela e exigiram “o pleno respeito pelos direitos humanos, a validade do Estado de direito e a convocação de eleições transparentes, livres, democráticas e competitivas, sem banimentos de qualquer tipo.” O Brasil não assinou o documento.

Na última sexta-feira, 17 de fevereiro, Alexei Navalny, o principal opositor de Vladimir Putin, que estava preso em um antigo gulag, perto do Ártico, passou a integrar — ao lado de Boris Nemtsov, Anna Politkovskaya, Alexander Litvinenko, Evgeni Prigojin e outros — a lista de opositores mortos desde que Putin chegou ao poder.

O presidente americano Joe Biden declarou que Putin é responsável pela morte de Navalny e disse estar “indignado mas não surpreso” com o ocorrido; o presidente francês, Emmanuel Macron escreveu: “na Rússia de hoje, os espíritos livres são colocados no gulag e condenado à morte. Raiva e indignação”; o chanceler alemão Olaf Scholz desabafou: “estou profundamente triste com a morte de Alexei Navalny. Ele defendeu a democracia e a liberdade na Rússia – e aparentemente pagou pela sua coragem com a vida”; a presidente da União Europeia, Ursula von der Leyen, decalrou:“Putin teme a dissidência de seu próprio povo mais do que tudo. O mundo perdeu um lutador pela liberdade em Alexei Navalny. Honraremos seu nome e, em seu nome, defenderemos a democracia e nossos valores.”

Inúmeros outros líderes e estadistas expressaram imediata solidariedade à família de Navalny e indignação pelo ocorrido. O Brasil não se manifestou. 

Nesse domingo, 18, dois dias após o ocorrido, ao ser questionado sobre o motivo de não ter se manifestado sobre a morte do principal opositor do autocrata russo Vladimir Putin, Lula afirmou que a causa da morte é desconhecida e que não lhe cabe fazer acusações.

Lula não é humanista

Lula não assinou a carta em repúdio às prisões arbitrárias na Venezuela, não comentou o assassinato do opositor de Putin, mas prometeu apoio moral e financeiro a ditaduras na África e assegurou dinheiro para os que querem destruir Israel.

No momento mesmo em que os mais importantes países ocidentais suspenderam o financiamento da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA), após terem provas cabais de que as escolas mantidas por essa organização doutrinavam crianças e jovens para odiarem judeus e praticarem a jihad e que vários de seus funcionários estavam envolvidos direta e indiretamente com o terrorismo islâmico, Lula achou por bem agir de modo contrário.

Em 15 de fevereiro, durante seu discurso na sessão extraordinária da Liga dos Estados Árabes, no Cairo, Egito, o presidente Lula informou que o Brasil fará novos aportes de recursos para a UNRWA e estimulou todos os países a manterem e reforçarem suas contribuições.

No sábado, 17 de fevereiro, durante reunião da 37ª Cúpula da União Africana, na Etiópia, Lula fez um discurso no qual tratou da guerra no Oriente Médio e abusou de sofismas, retorcendo os fatos e o valor das coisas até o ponto de dar a entender que ser humanista hoje é ser contra Israel.

Lula não deixou de mencionar a importância dos BRICS, esse estranho conglomerado dos países menos democráticos do mundo, que ele considera um contraponto adequado ao que chamou de “mazelas da globalização neoliberal.

No mesmo discurso, o presidente Lula criticou a paralisia da ONU em relação ao conflito entre Rússia e Ucrânia que, segundo ele, não terá solução militar, mas diplomática.

Aqui, é preciso lembrar que Lula, o pacificista, disse, em abril de 2023, que para acabar com a guerra, a Ucrânia deveria devolver a Crimeia, território ucraniano anexado pela Rússia. Além disso, Lula também já culpou a Ucrânia por ter sido invadida, condenou a ajuda dada pelos Estados Unidos e pela Europa ao país invadido, recusou-se a encontrar o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky e, por meio de sua Assessoria Especial, na figura de Celso Amorim, ofereceu tapete vermelho para a vinda de Putin ao Brasil em 2024, por ocasião do encontro do G20, que será realizado no Rio de Janeiro.

Por mais que se esmere em se vender como tal, Lula não é um humanista. Ele é apenas um político no sentido mais chão e menos nobre que se possa dar a essa palavra. O humanismo enquanto movimento filosófico é o contrário do que conhecemos como política no sentido lato porque ele conforma as coisas não à ideologia, mas ao paradigma humano na sua excelência, guiando-se por princípios norteadores de conduta e não por pragmatismos e conveniências.

Islã e Putin: uma ameaça global 

O escrutínio das questões atuais pressupõe primeiramente uma separação entre a realidade e o discurso. Por mais que se queira fantasiar em torno da realidade, a realidade se impõe e é com ela que devemos lidar. A realidade do momento atual é um mundo em ebulição onde países em vias de uma guerra de extermínio recorrem à retórica para justificar seus atos. Cabe a nós julgarmos não os discursos isolados dos fatos, mas os fatos por trás dos discursos.

Se o perigo da guerra fosse apenas a escalada da violência em um conflito local, talvez pudéssemos aceitar o distanciamento indiferente em torno das questões pungentes que os países em guerra enfrentam, mas o fato é que não há território neutro diante do potencial expansionista de quem já decidiu se enredar em uma guerra de conquista.

E esse é o caso tanto do tirano russo, Vladimir Putin, que intenta reinventar o império russo, quanto do movimento fundamentalista islâmico, que intenta impor a sua visão de mundo teocrática a todos os países que conseguir subjugar. Estamos diante de dois extremos: um império que quer se expandir e uma religião tribal que quer subjugar. Trata-se, portanto, de uma ofensiva global e não local.

Não se pode resumir a guerra no Oriente Médio como algo circunscrito à questão palestina. Uma vez que a expansão islâmica é o objetivo, não há razões para crermos que não haverá um entendimento entre todos os países islâmicos para a obtenção do triunfo final. A vitória deles, dos fundamentalistas, implicaria o extermínio de Israel e a derrota do Ocidente e daquilo que o Ocidente significa.

Da mesma forma, não se pode resumir o jogo macabro de Putin a uma aventura limitada à Ucrânia. Uma vez que a expansão da “Mãe Rússia” é o objetivo, não há razão para crermos que os países com uma história passível de ser manipulada pela retórica que evoca um passado glorioso haverão de ser poupados da anexação. Isso implicaria a reorganização da Europa e a derrota do Ocidente e daquilo que o Ocidente significa.

Mas o que, afinal, significa o Ocidente? Será só uma localização geográfica? Ou significa o legado específico de uma tradição? A segunda resposta é a verdadeira. O Ocidente significa a lenta e sofrida consolidação do humanismo perpassado pelo amor cristão, do ideal de fraternidade e justiça que respeita e exalta a dignidade e a liberdade do homem.

Não significa que esses valores estejam limitados ao Ocidente, mas que eles se consolidaram em instituições tradicionalmente ocidentais. O sistema político-jurídico no qual o ser humano tem a sua individualidade respeitada, preservada, protegida é aquele que se costuma traduzir por democracia ou Estado de direito.

Não vamos aqui fazer concessões aos demagogos, que usam o termo democracia distorcendo-o em seus fundamentos, pois sabemos que o esteio da democracia é o respeito aos direitos individuais e o império da lei. Sem isso, sem a certeza de que somos respeitados na nossa dignidade própria e que nem o Estado nem outro indivíduo pode se impor pela força sobre nós, não se pode falar em democracia.

Voltemos então à situação das guerras em curso e da postura dos que se arrogam democratas e humanistas. Será compatível com a visão de mundo democrática apoiar a ala mais radical do mundo islâmico, que se move por ódio, que perpetua o ódio e que prega o ódio em nome da fé? Será compatível com uma postura humanista apoiar um tirano que mata opositores, invade países vizinhos, sequestra crianças e ameaça o mundo com a apavorante expectativa de um ataque nuclear?

Pois bem, em torno de Putin e do fundamentalismo islâmico estão sendo feitas alianças. De um lado temos a República Islâmica (Irã), o Hamas, o Hezbollah, os Houthis, a Turquia, os demais países árabes ditatoriais e os numerosos grupos terroristas islâmicos de denominações menos conhecidas. Flertando com eles contra o inimigo comum temos a própria Rússia, a Coreia do Norte, a China, além de países de menor expressão como os arremedos de ditaduras socialistas da América Latina.

Do outro lado temos as democracias liberais, as tais potências ocidentais, com as qualidades e defeitos que já conhecemos. É o chamado “mundo livre”, a sociedade aberta. Um grupo de países nos quais as conquistas civilizacionais tendem a não mais retroceder; um grupo de países que já aprendeu com duas guerras mundiais insanas e que tenta, por todos os meios, evitar uma terceira. Um grupo de países que está longe da justiça perfeita, mas bem mais próximo da justiça factível do que os países cujo povo é subjugado por ditadores ou aiatolás fanáticos e inconsequentes.

Esse é o cenário global. O mundo se bifurca em duas tendências: uma tendência autocrática e uma tendência democrática. O Brasil tem, nesse momento, um presidente que se diz democrata mas acena positivamente para os regimes autocráticos.

Não é essa a nossa tradição diplomática. Não somos obrigados a engolir essa postura equivocada sem criticar.

O que importa, dizíamos, não é o discurso, mas a realidade que por trás dele se esconde. E a realidade é que, nesse delicado momento que o mundo vive, o presidente Lula está aproximando o Brasil do eixo do mal.

O papel dos democratas na idade das trevas

O atual debate polarizado sobre a guerra do Hamas contra Israel evidenciou como o analfabetismo democrático é profundo e generalizado entre nós. Sobre isso, no dia 25 de novembro de 2023, publiquei no X (antigo Twitter) a seguinte declaração que tem como título a imagem de três velas acesas (para lembrar que a democracia não é a luz de um holofote, mas a de miríades de pequenas velas).

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Não adianta tentar convencer da democracia pessoas que não fazem a menor ideia do que é democracia (tomando-a como sinônimo de regime eleitoral) e, se sabem o que é, não apostam na democracia. Elas não acham que a democracia seja um valor universal, mas apenas ocidental, quando não imperialista e colonialista. Elas nem sabem que existem ou não acreditam nos grandes centros que monitoram a democracia no mundo, como a Freedom House, a The Economist Intelligence Unit e o V-Dem.

Então essas pessoas defendem um Estado palestino, mas estão pouco se lixando se esse Estado, comandado pelo Hamas ou por outra organização do jihadismo ofensivo islâmico, for uma tirania teocrática (como o Irã) ou uma autocracia genocida (como a Síria). Estão assobiando e andando se uma sociedade dominada por um Estado desse tipo for misógina e com altos graus de violência doméstica, onde LGBTs são reprimidos e mortos, onde não vigora a liberdade de opinião pela própria ausência do conceito de opinião (doxa), onde fazer oposição é um ato de traição.

Seria preciso um longo processo de conversão para que uma pessoa que pensa assim pudesse participar constutivamente de conversações democráticas.

Toda uma geração que foi doutrinada com ideias antidemocráticas (como a maioria dos combatentes atuais do Hamas, da Jihad Islâmica, do Hezbollah) e ensinada a reproduzir comportamentos autocráticos não virará, em sua imensa maioria, defensora da democracia só porque agora têm um Estado para chamar de seu. E não deixará de querer exterminar Israel só porque têm sua própria ditadura reconhecida internacionalmente. Se fosse assim, o Irã, a Rússia e outras autocracias onde vive a maior parte da população mundial – que são Estados reconhecidos – não estariam financiando ou apoiando o terrorismo e a guerra contra as democracias liberais em escala global.

Infelizmente é forçoso reconhecer que isso significa que, para a maioria da humanidade, no curto (e talvez no médio) prazo não haverá democracia, não haverá paz, nem haverá respeito aos direitos humanos. É a terceira onda de autocratização na qual já estamos imersos, que não sabemos quanto durará.

O papel dos democratas durante essa idade das trevas é manter vivas conversações democráticas onde for possível, multiplicando – mesmo que em iniciativas locais – o número de democratas, encontrando e palmilhando novos caminhos na escuridão e usando suas pequenas luzes para usinar novas matrizes de interação com o mundo que tenham a ver com comportamentos consonantes com ideias de liberdade como sentido da política, de autonomia, de colaboração, de auto-organização, de rede (mais distribuída do que centralizada) e de convivencialidade (amistosa ou não-adversarial).