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Toffoli no ‘Times’: a orgia político-jurídica brasileira

Durante toda essa semana, o “amigo do amigo do meu pai” foi tema dos principais editoriais brasileiros, tendo ido parar também no Financial Times por instruir investigação sobre a Transparência Internacional (TI), depois que esse órgão de fiscalização da corrupção divulgou um relatório no qual aponta as suas recentes ações como um dos fatores para o péssimo desempenho do Brasil no índice anual de Percepção da Corrupção.

“Amigo do amigo do meu pai”, como se sabe, é o codinome de referência ao ministro Dias Toffoli(na foto à esquerda com Lula, e na da direita com Jair Bolsonaro) nas tratativas ilícitas do empreiteiro Marcelo Odebrecht“Amigo do meu pai”, por sua vez, é o atual presidente da República, Lula – que ficou preso em Curitiba após condenações da Lava Jato -, que conhecia Emílio Odebrecht desde quando era sindicalista, como prontamente denunciou, na ocasião, a revista Crusoé, em edição então censurada pelo ministro Alexandre de Moraes.

As ações descaradas de Dias Toffoli, que enlamearam ainda mais a imagem do Brasil no ranking de Percepção da Corrupção, foram a suspensão da multa de 10 bilhões de reais da empreiteira J&F — cliente do escritório de advocacia da sua esposa — e a suspensão da multa de 3,8 bilhões de reais da própria Odebrecht, em cujas tratativas seu codinome aparecia, tendo sido decodificado em delação.

“Desfazer o legado da Lava Jato

O artigo do Financial Timesexplica para os seus leitores que a ordem dada por Toffoli para investigar a organização anticorrupção que denunciou o desmonte do combate à corrupção no Brasil é a medida mais recente do ex-advogado do PT “que nos últimos meses tem procurado desfazer o legado da Lava Jato, investigação anticorrupção no Brasil, que […] revelou um vasto esquema de subornos por contratos envolvendo executivos do grupo estatal de energia Petrobras, um cartel de empresas de construção e dezenas de legisladores de todo o espectro político”.

O artigo lembra ainda que o Departamento do Tesouro dos EUA classificou o esquema de corrupção na Petrobrás desvelado pela Lava Jato como o maior caso de suborno estrangeiro da história e finaliza citando o relatório da Transparência Internacional, segundo o qual “graças às decisões de Toffoli, o Brasil se tornou um cemitério de evidências de crimes que geraram miséria, violência e sofrimento humano em mais de uma dezena de países da América Latina e da África”.

Falso e leviano

Ante as denúncias da TI, Toffoli tentou usar a Procuradoria Geral da República (PGR) para investigar a ONG por suposta apropriação de recursos recuperados pela Lava Jato. O diretor-executivo da Transparência Internacional, Bruno Brandão, declarou que recebeu com espanto o pedido de investigação de Tofolli, que qualificou de “falso e leviano”.

A parte da imprensa que cumpre o seu papel de fiscalizar o poder, logo trouxe à tona o fato de que a PGR já havia analisado anteriormente o mesmo tipo de denúncia, declarando inverídicas as acusações contra a Transparência Internacional, que apenas deu consultoria sobre a destinação dos recursos da Lava Jato para projetos sociais e entidades de combate à corrupção, sem receber qualquer tipo de remuneração pela assistência prestada.

Já a outra parte da “imprensa” que cumpre o desprezível papel de difundir as narrativas falsas dos donos do poder insistiu nas mentiras contra a atuação da Transparência Internacional, tentando comprometer a reputação de um órgão respeitado internacionalmente.

Um dos blogs sujos petistas mais conhecidos e caricatos teve o despudor de dar a seguinte manchete: “Transparência Internacional é um batalhão na guerra contra a soberania do povo brasileiro’: população apoia decisão de Toffoli”.

As duas mãos da esquerda

Como bem lembrou, em O AntagonistaCarlos Graieb, “o protagonismo do ministro Dias Toffoli não deve ocultar a presença de outros atores na pornochanchada jurídica” que aliviou a multa das empresas corruptas.

Graieb lembra que a suspensão da punição da J&F não prescindiu da contribuição do PT e dos advogados que integram o grupo Prerrogativas, assim como dos partidos satélites de esquerda (Psol, PsdoB e solidariedade) que impetraram ação para suspender os acordos de leniência alegando que foram assinados sob um “estado de coisas inconstitucional” criado pela Lava Jato.

A esquerda se pôs a serviço dessa empresa gigante, explicou ainda Graieb, no Papo Antagonista, para atacar juridicamente os acordos de leniência: “As duas mãos da esquerda estão nessa liberação [das multas]. Não é efeito de uma coisa engenhosa dos advogados da J&F, mas efeito de uma coisa engenhosa dos partidos que orbitam o Lula, do partido do Lula, e dos advogados milionários que são amigos dele”.

O abraço ambidestro 

É nauseante acompanhar o desenrolar das estratégias dos corruptos no nosso país, é revoltante assistir ao servilismo hipócrita dos que se beneficiam do atual estado de coisas e é desalentador constatar que o brasileiro comum não tem tempo ou disposição para retirar as camadas de hipocrisia que recobrem as notícias que lhe chegam refratadas pelo prisma dos mais variados interesses.

Não é porque acabamos de demonstrar o descaramento de uma esquerda que se diz defensora dos mais pobres quando, na verdade, atua em benefício de empresários milionários corruptos que vamos esquecer o descaramento da direita que blindou Dias Tofolli da CPI da Lava Toga em troca da paralisação, no STF, das investigações das rachadinhas de Flávio Bolsonaro.

Na orgia político-jurídica brasileira, em que os poderosos gozam na cara do pagador de imposto, o regaço do “amigo do amigo de meu pai” é generoso; ele se abre à esquerda e à direita.

UNRWA: educação para morte e financiamento do mal

Após o escândalo do envolvimento direto de doze funcionários da UNRWA no massacre de 7 de outubro, o seu diretor, Philippe Lazzarini, anunciou, em comunicado de imprensa, que tinha rescindido o contrato desses funcionários. Antonio Guterres, secretário-geral da ONU, por sua vez, confirmou que doze pessoas são alvo de investigação e nove foram despedidas.

Pronto? A demissão dos funcionários que estavam diretamente envolvidos com o Hamas por acaso reverte todo a teia de relações indiretas da UNRWA com o terror? Não. Por isso é preciso que todo o mundo livre pare imediatamente de financiar essa organização cúmplice do terrorismo islâmico.

Finalmente, após a divulgação do dossiê que mostra que doze funcionários com folha de pagamento na ONU estavam envolvidos no massacre perpetrado pelo Hamas, catorze países anunciaram que suspenderiam os seus pagamentos à essa organização que se diz humanitária. Entre esses países estão Alemanha, Canadá, Grã-Bretanha, Itália, Estados Unidos, Japão, etc.

Diga-me quem financias

E o Brasil? Desconfio que não faça mais parte do tal mundo livre, dada a sua escancarada simpatia por ditaduras e teocracias. Vide suas companhias no Brics. Diga-me com quem andas e quem financias, e eu te direi que tipo de regime és.

Nosso país já doou, desde 2008, o equivalente a 20 milhões de dólares para UNRWA (conforme informação dada pelo Itamaraty, em resposta a um pedido de Crusoé). O Ministério de Relações Exteriores afirmou ainda que o governo brasileiro mantém o compromisso histórico de apoio a essa organização da ONU.

Não surpreende que o Brasil vá na contramão dos países que decidiram fechar a torneira do dinheiro ante a cumplicidade escancarada dessa organização com o terror. Conforme nota da Crusoé, um dia depois que a ONG UN Watch divulgou um relatório mostrando que vinte funcionários da UNRWA comemoraram o massacre de 7 de outubro em suas redes sociais, Celso Amorim, assessor da Presidência da República declarou:

Uma contribuição financeira simbólica à UNRWA está sendo feita imediatamente. Uma contribuição mais substancial está sendo preparada e será anunciada em breve.

UNRWA é pior do que você pensa

Brendan O´Neill publicou, em 29 de janeiro, na revista Spiked, um artigo intitulado A UNRWA é pior do que você pensa, no qual expõe a hipocrisia e a perversão daqueles que passaram “o Dia Memorial do Holocausto aplaudindo uma organização cujos membros são acusados de massacrar judeus”.

Enquanto toda a gente acendia velas para os seis milhões de judeus assassinados pelos nazis, os militantes de woke faziam campanhas na internet “para elogiar e até angariar fundos para um grupo cujos funcionários são suspeitos de massacrar judeus”, escreveu O´Neill, referindo-se ao movimento da classe ativista que recorreu ao X para angariar apoio para a UNRWA em resposta à suspensão das doações por parte da Grã-Bretanha e de outras nações, fato que coincidiu com o dia internacional da lembrança do Holocausto, 27 de Janeiro.

A atitude dos EUA, Reino Unido, Austrália e outros países de suspenderem o fluxo de dinheiro para a UNRWA enquanto as autoridades investigam o envolvimento do seu pessoal com um grupo terrorista que massacrou milhares de pessoas é bastante racional, justificável e legítima. A esquerda woke, porém, não pensa assim. Eles berram que a UNRWA é ótima e essencial para o bem-estar dos palestinos.

Para eles todos todos os governos que suspenderam as doações são agora cúmplices do “genocídio” de Israel. Eis “as profundezas obscuras do duplo discurso em que a esquerda agora mergulhou: expressar preocupação sobre as possíveis ligações de um grupo ao terrorismo genocida é “genocida”; tentar manter o seu dinheiro fora dos bolsos de pessoas que supostamente ajudaram a coordenar o pior ato de violência racista do século XXI é “racista”. Guerra é paz, liberdade é escravidão, não querer que os judeus sejam massacrados é fascismo. O contorcionismo moral é doloroso”, escreve o analista político britânico.

23% dos funcionários

A verdade, exposta não apenas nesse artigo da Spiked, mas denunciada também aqui em muitos artigos publicados em O Antagonista, é que a UNRWA está há muito comprometida moral e politicamente. 

Conforme noticiou a Crusoé, o jornal americano Wall Street Journal publicou nesta segunda, 29 de janeiro, uma reportagem afirmando que 23% dos funcionários homens da UNRWA têm conexões com terroristas do Hamas ou da Jihad Islâmica.

A Agência das Nações Unidas de Assistência e Obras aos Refugiados da Palestina se vende como parte da solução para a guerra no Oriente Médio quando, na verdade, ela é um dos grandes problemas.

Criada em 1949 com o pretexto de ajudar os refugiados palestinos gerenciando o acesso à educação, saúde e ajuda alimentar, a UNRWA se tornou uma hidra que supervisiona vastas áreas da vida social em Gaza, centralizando a distribuição da assistência humanitária, mas que atua principalmente na área educacional, gerenciando 715 escolas para mais de meio milhão de meninos e meninas em Gaza, na Cisjordânia, em Jerusalém Oriental, na Síria, no Líbano e na Jordânia.

Parece um trabalho bonito não é? A fachada de humanitarismo, porém, recobre a gravidade de uma doutrinação nefasta que retroalimenta no coração dos palestinos o ódio contra os judeus, inclinando jovens, geração após geração, a um fundamentalismo que inviabiliza qualquer projeto de paz naquela região.

Doutrinação e terror

Além das acusações específicas contra os 12 referidos funcionários que teriam participado ativamente do ataque de 7 de outubro de 2023, as autoridades israelenses também acusam a agência da ONU de distribuir livros escolares a crianças palestinas contendo incitamento à violência e ao ódio contra os judeus. Segundo a ONG Impact-SE, os livros contêm inúmeras frases como “Sionistas são terroristas” ou “como cortar o pescoço do inimigo”.

Essas denúncias, porém, não são novas. Quando o antigo presidente dos EUA, Donald Trump, cortou o financiamento dos EUA à UNRWA, em 2018, já havia uma série de indicações de que a instituição não evitava a propagação do radicalismo islâmico.

Tanto é assim que, quando o presidente Joe Biden renovou o financiamento em 2021, assinou-se um documento de Cooperação no qual foi estabelecido que o financiamento contínuo dos EUA exigia que a UNRWA implementasse várias reformas, incluindo o combate ao incitamento ao ódio e ao antissemitismo no seu currículo educacional, exigindo a neutralidade do seu pessoal e garantindo que as instalações da UNRWA não seriam utilizados por organizações terroristas e o seu pessoal não estaria afiliado a elas. Temos a certeza agora de que essa reforma não foi efetivada.

Em matéria publicada em 2021 na revista americana Foreign Policy, lemos o seguinte:

Quase 60 por cento do orçamento anual de cerca de 1 bilhão de dólares da UNRWA é atribuído a programas educativos que pretendem ensinar às crianças valores de paz, tolerância e resolução não violenta de conflitos. No entanto, de acordo com vários estudos sobre o currículo palestino, ministrado pela UNRWA nos territórios palestinos, a agência está muito aquém desse objetivo. Os manuais retratam os judeus como inimigos do Islã, glorificam os chamados mártires que morreram enquanto cometiam ataques terroristas e promovem a jihad para a libertação da Palestina histórica, incluindo áreas firmemente dentro das fronteiras de Israel anteriores a 1967, como Jaffa e Haifa. Os mapas da região não incluem o estado de Israel, que em todo o currículo é referido como “a Ocupação Sionista”.

Livros didáticos

A referida matéria aborda um relatório divulgado em Junho de 2021, financiado pela União Europeia e conduzido pelo Instituto Georg Eckert para a Investigação Internacional de Livros Didáticos, que examinou 172 livros escolares palestinos utilizados nas escolas da UNRWA.

O relatório mostra que uma aula de educação islâmica do 5º ano, por exemplo, pede aos alunos que discutam as “repetidas tentativas dos judeus de matar o Profeta” e depois pede-lhes que pensem em “outros inimigos do Islã”.

Outra lição do 5º ano é sobre Dalal Mughrabi, autora do massacre da Estrada Costeira de 1978, um dos piores ataques terroristas da história de Israel, que matou 38 civis israelenses, incluindo 13 crianças. A lição sobre ela diz: “Nossa história palestina está repleta de muitos nomes de shuhada (mártires) que sacrificaram suas vidas pela pátria, incluindo a shahida (mártir) Dalal Mughrabi, cuja luta assumiu a forma de desafio e heroísmo, o que tornou sua memória imortal em nossos corações e mentes”.

O relatório concluiu que “não são apresentados mais retratos de figuras femininas significativas na história palestina”, pelo que “o caminho da violência parece implicitamente ser a única opção para as mulheres demonstrarem um compromisso notável para com o seu povo e o seu país”.

As pedras

Já o livro de estudos sociais do 7º ano propaga a teoria da conspiração de que Israel removeu pedras de locais antigos em Jerusalém e substituiu-as por pedras com desenhos e formas sionistas. Um livro de educação islâmica do 9º ano apresenta passagens sobre a jihad e “a sabedoria por trás da luta os infiéis”,

O currículo fora das ciências sociais também é preenchido com linguagem violenta e glorificação dos militantes. Uma aula de gramática do 6º ano, por exemplo, inclui a frase “defenderemos a pátria com sangue”. Uma lição da 8ª série ensina aos alunos que “a Jihad é uma das portas para o Paraíso”.

Desde 2021 já se sabia que vários funcionários da UNRWA faziam parte do Hamas e que muitos deles publicavam conteúdos violentos e antissemitas nas redes sociais, com alguns elogiando Adolf Hitler.

Em uma infeliz declaração, após o massacre de 7 de outubro, o secretário-geral da ONU, o socialista António Guterres, afirmou: “É importante reconhecer também que os ataques do Hamas não aconteceram no vácuo”. Ele tem razão. Não aconteceram no vácuo. O mundo deu tempo e dinheiro demais para que o fundamentalismo se incrustasse nas mentes infantis e o mal fermentasse sob o olhar hipócrita e cúmplice da organização que ele representa.

Aborto na Constituição: arrogância socialista e perversão da lei

No célebre opúsculo La loi (A lei), publicado em 1850, Frédéric Bastiat estabelece os fundamentos antropológicos naturais da lei: vida, liberdade e propriedade. A lei é justiça. Não uma justiça positiva, que se arroga poder organizar a fraternidade e a solidariedade, mas uma justiça negativa que se limita a evitar que os direitos de um usurpem os direitos do outro. A lei seria, portanto, apenas “a organização do direito individual preexistente de legítima defesa.”.

A expansão indefinida de direitos faz com que a lei deixe de representar a justiça e passe a ser instrumentalizada para a proteção dos interesses corporativos e das categorias. Quando a lei não se limita ao seu próprio papel, ela age contrariamente ao seu próprio fim e destrói o seu propósito, destrói a justiça que deveria fazer reinar e coloca a força coletiva, representada pelo Estado, contra a vida deveria proteger.

A atualidade desse texto de Bastiat é considerável e pode ser aplicada para interpretar as mazelas sócio-econômicas do Brasil, onde a mentalidade socialista ganha terreno com o subterfúgio da concessão de direitos e a aplicação de uma lei iníqua já instrumentalizada pela casta dos poderosos que usam suas prerrogativas políticas e jurídicas para favorecer seu agrupamento político-ideológico em um ciclo perpétuo de corrupção e impunidade.

Nosso interesse nesse artigo, porém, é explorar outro âmbito e usar esse preâmbulo para abordar a questão do aborto, tido como um direito por alguns, rejeitado como um crime por outros e prestes a ser institucionalizado na França.

A lei Veil, a descriminalização na França e o aborto como mal menor

A prática do aborto já foi descriminalizada na França desde 1975, com a promulgação da Lei Veil. O nome da lei faz referência a Simone Veil, então ministra da Saúde da França, que pronunciou um discurso em 1974 defendendo o novo projeto de lei.

No discurso que deu nome à lei, vê-se claramente que o aborto é considerado um mal, tolerado em determinadas circunstâncias e que o foco da lei era evitar uma aplicação penal contra as mulheres que o praticavam. Nas palavras da própria ministra, que foi também a primeira mulher a presidir o Parlamento Europeu, “o aborto deve continuar a ser a exceção, o último recurso para situações desesperadoras”. Ela acrescenta: “ainda é um drama e sempre será um drama”.

Ou seja, o aborto é um mal menor, expresso na referida lei como uma exceção.  Ele só deveria, portanto, ser permitido no caso de preservar um bem maior, a saber, a vida da mãe.

O aborto não pode ser entendido como um direito ou como uma liberdade em si. É isso que explica Grégor Puppinck, diretor do Centro Europeu de Lei e Justiça, em artigo publicado na revista francesa Valeurs actuelles, no qual critica o projeto de lei constitucional do governo de Emannuel Macron, relativo à liberdade de recursos para o aborto, recentemente aprovado na Assembleia Nacional Francesa.

IVG (Interrupção voluntária da gravidez) na Constituição francesa

A proposta com o objetivo de consagrar o “direito” ao aborto na Constituição foi apresentada pela primeira vez em 2018, pelo partido de extrema esquerda La France Insoumise (FI). Na ocasião, os partidários do presidente Emmanuel Macron votaram contra o projeto. Agora, sob o pretexto de que, em várias partes do mundo, e particularmente nos Estados Unidos, esse suposto “direito” ao aborto está ameaçado, os próprios macronistas propuseram acrescentar na Constituição uma frase que, apesar da complicação, prevê essencialmente a mesma coisa que o projeto de lei da extrema esquerda previa.

Apesar da sensata declaração contrária do presidente do Senado, Gérard Larcher, que tentou retomar o bom senso alertando que “constituição não é um catálogo de direitos sociais”, foi aprovado, por 99 votos a favor e 13 contra, o estranho texto constitucional segundo o qual “a lei determina as condições em que se exerce a liberdade da mulher, que lhe é garantida, de recorrer à interrupção voluntária da gravidez”.

Para Grégor Puppinck, autor do referido artigo da Valeurs actuelles, essa formulação mostra que “obviamente, o governo não sabe o que é uma liberdade e o que a distingue de um direito”.

Vimos que o aborto, mesmo sob a óptica de quem militou para descriminalizá-lo, é um mal. Ora, “um mal, mesmo que considerado necessário, não pode ser um direito ou uma liberdade, mas apenas uma exceção. […] A lei obedece à sua própria racionalidade que é a da justiça. Cabe ao legislador servi-lo e não utilizá-lo para fins políticos”, afirma o jurista.

A sentença proposta e aprovada na Assembleia Nacional Francesa é, portanto, uma excrescência: “primeiro quanto ao seu objeto, porque o aborto não tem lugar numa Constituição. Depois, quanto à sua expressão, porque falar em ´liberdade garantida´ é redundante.” Para Puppinck, a frase aprovada não acrescenta nada à lei já existente que organiza o acesso ao aborto e sua única novidade seria incluir na Constituição que o aborto é uma “liberdade”, o que seria malbaratar a lei.

Aborto não é um direito nem uma liberdade

As noções de “liberdade” e “direito”, afirma o jurista, não podem ser aplicadas ao aborto: “a liberdade é uma faculdade natural da pessoa que o Estado se compromete a respeitar porque considera que esta faculdade é boa. Ela inclui, por exemplo, liberdades de expressão, pensamento, movimento ou negócios. Todos possuem naturalmente estas faculdades, e tudo o que se pede ao Estado é que não dificulte o seu exercício, que garanta o seu livre exercício, sem prejudicar os outros”.

Um direito, por sua vez, é, ou um bem natural que deve ser protegido, ou um bem não natural que pode ser reivindicado ao Estado em nome da justiça.

Embora uma perspectiva política radicalmente libertária queira delimitar o Estado apenas ao uso legítimo da força para garantia dos direitos naturais e do cumprimento dos contratos, é amplamente aceito, inclusive entre liberais moderados, que alguns direitos sociais como educação e saúde decorrem da própria finalidade do Estado, cuja existência se justifica e fundamenta na busca pelo bem comum.

Isso posto, concordamos com o autor do artigo que “dizer que o aborto é uma liberdade, como propõe o governo, é um absurdo, porque o aborto não é uma faculdade natural da pessoa.” O aborto, ou IVG, como os franceses costumam chamar, tampouco se encaixa na categoria de direito: “Isto suporia ou que o aborto corrige uma injustiça entre duas pessoas – o que obviamente não é o caso – ou que a sociedade considera que o aborto é uma necessidade humana fundamental, da mesma forma que a educação ou a saúde. É aqui que está a esquerda. Mas isto pressupõe que o aborto é um bem em si, da mesma forma que a saúde ou a segurança. Mas obviamente não é esse o caso.”

Na gênese dessa confusão entre liberdade e direito produzida pela esquerda está a perda do sentido clássico de liberdade. Da noção de defesa da vida e limitação do poder coercitivo do Estado passou-se para a noção de libertação, tanto no sentido de obtenção de determinadas condições e exigência de direitos sociais quanto no sentido de libertação do que consideram amarras de uma moral tradicional e “burguesa”.

É assim que, paulatinamente, com intervenções como essa que está acontecendo agora na França e como tantas outras que acontecem aqui no Brasil, a “arrogância socialista” à qual Friedrich Hayek se referiu na sua obra vem substituindo “um sistema moral altamente evoluído, bastante sofisticado em nossa ordem espontânea” por um “projeto novo e abrangente de nossa moral, da lei, da linguagem tradicional.”

Nesse novo mundo, criado pelos engenheiros sociais progressistas, mulheres podem ser homens, homens podem ser mulheres, e uma vida indefesa pode ser aniquilada com as bênçãos da Constituição.

É a perversão final prevista por Bastiat: “A lei pervertida! A lei não apenas desviada de seu objetivo, mas aplicada para perseguir um objetivo diretamente oposto! A própria lei cumprindo a iniqüidade a quem sua missão era punir!

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Lula: cai a máscara democrática de um tirano

Lula tem uma habilidade ímpar de transmutar seu discurso ao gosto do ouvinte, adequando-o ao público que o ouve. É um príncipe. O príncipe, de Maquiavel. Aquele que não tem rigidez moral, mas se move de acordo com as circunstâncias. A ética, para ele, não é uma camisa de força como o é para os tolos que tentam efetivamente agir com retidão e justiça e, tendo isso em vista, agem dentro de determinados parâmetros, sem abrir mão de princípios.

Lula e seus asseclas estão de volta ao poder porque, para eles, o poder sempre foi a meta. Eles são mais eficientes na sua conquista porque não impõem restrições morais a esse objetivo. Para voltar ao poder no Brasil, foi necessário colocar a máscara do democrata. Tarefa difícil para quem, além de ter sido condenado por corrupção, deu apoio político e financeiro aos regimes ditatoriais de esquerda da América Latina.

O figurino de democrata só voltou a colar porque surgiu um palhaço maior na República que, não tendo o ardil de esconder seu pendor antidemocrático, seduziu, com a retórica inflamada dos loucos, aqueles que já estavam saturados do teatro petista de décadas.

O tal “Sul global”

pomposa cerimônia do 8 de janeiro   – que comemorou uma democracia supostamente inabalada e ungiu Lula como seu defensor perpétuo – deu a ele a confiança necessária para pôr de lado a incômoda fantasia. Ciente do êxito do espetáculo e da força do conluio que o sustém, Lula pode agora passar para uma nova fase na qual sua lógica ideológica e pendor autoritário não precisam de justificação.

O endosso formal de Lula à infundada acusação de que Israel está cometendo genocídio mostra que ele já não se importa em ser visto por todo o mundo livre como mais um populista inconsequente. Ele não se importa porque acredita que pode liderar o tal “Sul global”, um bloco formado por ditadores e autocratas, que, sob a bandeira do vitimismo, tentam confrontar o Ocidente.

A atitude foi tão despropositada e tão contrária à tradição diplomática brasileira que conseguiu a proeza de fazer com que EstadãoO Globo e até mesmo a Folha de S.Pauloescrevessem editoriais criticando-a. 

Para o Estadão, a denúncia contra Israel por genocídio, apresentada à Corte Internacional de Justiça (CIJ) pela África do Sul e endossada pelo Brasil, “não leva em conta o fato de que Israel foi atacado por um grupo terrorista cuja missão declarada é exterminar os judeus”, portanto, explica o jornal, “não tem bases fáticas e jurídicas sólidas”.

A banalização do genocídio

A acusação de que Israel — o país que foi fundado para oferecer segurança aos judeus depois que 6 milhões deles foram exterminados pelo nazismo — estaria cometendo genocídio é extremamente grave. Ela banaliza o termo, uma tipificação de crime que foi criada justamente como “resposta da comunidade internacional à dimensão extraordinária do Holocausto”, lembra o jornal.

A argumentação do editorial O Globo segue o mesmo tom duramente crítico: “Ao atender ao pedido do embaixador palestino no Brasil, Lula viola a tradição de equilíbrio da diplomacia brasileira, banaliza uma acusação que só deveria ser feita com a maior parcimônia, em atitude que fortalece a vertente mais insidiosa do antissemitismo contemporâneo“.

Folha de S.Paulo, por sua vez, expõe o duplo padrão moral de Lula: 

“Relatório recente da Human Rights Watch aponta a oscilação de líderes mundiais quando se trata de condenar violações dos direitos humanos. Eles tendem a fazer vista grossa quando os perpetradores são governos aliados e a carregar nas tintas contra adversários. Um dos criticados pela organização global, o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT), acaba de oferecer novo subsídio para a tese.”

O mundo passa por uma grande turbulência. O presidente americano, Joe Biden, em discurso de apoio a Israel, logo após o início da guerra, fez a seguinte declaração: “O Hamas e Putin representam ameaças diferentes, mas têm algo em comum: ambos querem aniquilar completamente uma democracia vizinha”.

Como entender que um presidente que quer se passar por democrático coloque o Brasil não ao lado das democracias ameaçadas por grupos terroristas e por tiranos, mas ao lado dos que as querem exterminar? 

Como interpretar o descaso de Lula pelo acordo Mercosul-União Europeia e o seu empenho com o BRICS no qual se congregam os países mais liberticidas e antidemocráticos do mundo senão como a deposição da máscara de democrata e a assunção da essência de um tirano?

8 de janeiro: democracia inabalada?

Democracia é um regime político, originado na Grécia Antiga, baseado nos princípios de isegoria (igualdade do ponto de vista da palavra) e isonomia (igualdade perante a lei), que surge quando o poder decisório, deslocado para o espaço público, passa para o demos (povo) e a autoridade, outrora unificada na figura do tirano, é distribuída para o chefe militar, o chefe religioso e o governante, todos escolhidos pelos cidadãos.

Na modernidade, com a formação dos Estados nacionais e a consolidação do conceito de soberania, os valores de igualdade e liberdade, instituídos na antiga Grécia, retornam na defesa de um Estado liberal contra o Estado absoluto.

Um Estado liberal não é necessariamente democrático nem um governo democrático é necessariamente liberal. Conforme explica Norberto Bobbio no livro Liberalismo e Democracia, trata-se de duas exigências fundamentais que nasceram com o Estado moderno: a exigência de limitar o poder (liberalismo) e de distribuí-lo (democracia).

Quais são, então, as características do Estado democrático? Elenquemos algumas: distinção entre o poder e o governante, garantida pela presença de leis, divisão das esferas de autoridade e existência de eleições; princípio republicano de distinção entre o público e o privado, existência de situação e oposição, maioria e minoria, respeitadas pela lei; legitimidade do dissenso e do contraditório.

Quais são, ainda, os pressupostos do Estado liberal? A doutrina dos direitos do homem elaborada pela tradição do direito natural, que está na base do direito proclamado nas duas principais revoluções liberais, a Revolução Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789).

O Estado Democrático de Direito é, pois, aquele em que os poderes públicos são regulados por normas gerais (as leis fundamentais e constitucionais). É o governo de leis e não o governo dos homens. É um Estado, em suma, dotado de mecanismos constitucionais que obstaculizam o exercício arbitrário e ilegítimo do poder. Esses mecanismos são:

1 – Controle do Poder Executivo pelo Poder Legislativo;

2 –Eventual controle do Legislativo por uma Suprema Corte à qual se pede a averiguação da constitucionalidade das leis;

3 – Magistrado independentedo poder político.

Armados dessa introdução conceitual, passemos a analisar o 8 de janeiro de 2023.

O que houve de fato nessa data? Milhares de bolsonaristas, que estavam há dias acampados em frente a quartéis, invadiram a Praça dos Três Poderes. Alguns quebraram vidros, relógios, picharam estátuas, defecaram no STF, urinaram na tapeçaria, esfaquearam um Portinari e rasgaram a Constituição. 

Esses foram os fatos. Mas, como diria Nietzsche, não existem fatos, só existem interpretações. Então, vamos elas. 

Quem mais se beneficiou da patacoada bolsonarista foi, obviamente, Luiz Inácio Lula da Silva, que posa hoje de herói da democracia e aproveita a oportunidade para estreitar laços com todos os ministros do STF, convidando-os para churrascos e, claro, para a solenidade “Democracia inabalada”, que marcará um ano dos “ataques golpistas às sedes dos três Poderes, em Brasília”, reunindo no Congresso Nacional cerca de 500 convidados, entre autoridades e representantes da sociedade civil.

O ministro Alexandre de Moraes confirmou presença no pomposo evento, durante entrevista para O Globo, na qual declarou que “quem não acredita na democracia, não deve participar da vida política do país.” 

Estranha, porém, essa democracia tornada inabalável através de ações autoritárias que corrompem a democracia em seus princípios. Na democracia em que acredito, o Supremo Tribunal Federal não instaura inquérito de ofício – que dura cinco anos – para investigar Fake News, nem ministro julga processo no qual é também investigador e vítima. Na democracia em que acredito, há garantia de direitos individuais mesmo se o investigado tiver cometido o que seria, na cabeça de alguns, o maior de todos os delitos: ser bolsonarista.

A massa de manobra que invadiu a Praça dos Três Poderes em 8 de janeiro é formada principalmente por pessoas de classe média baixa, doutrinadas durante anos por um discurso raso, reducionista, reacionário e belicoso, difundido por meio de aplicativos de mensagens. 

São pessoas comuns, alguns jovens, mas, principalmente, pessoas de meia idade: pais e mães, avôs e avós de família, que deveriam ser processadas individualmente por dano ao patrimônio público não por cinco crimes, como julgou procedente o autoritário e inclemente Alexandre de Moraes.

Muitos bolsonaristas estão se lixando para a democracia, queriam sim fechar o congresso, o STF e adorariam ver um golpe de Estado. Mas eles não eram capazes de dar esse golpe, portanto não deveriam ser julgados e condenados por isso. 

Como bem escreveu Diogo Mainardi, em seu blog, no site Não é imprensaos bolsonaristas que, ao contrário de Bolsonaro, participaram do quebra-quebra foram iludidos de que aquilo resultaria num golpe, mas o fato é que nunca houve o menor perigo de que isso ocorresse, porque os militares não estavam dispostos a derrubar o regime. O Brasil inventou essa modalidade de golpistas sem golpe, que serviram de pretexto para o grande conluio nacional.” 

O que vai ser celebrado, portanto, na cerimônia “Democracia inabalada” não é a democracia, mas o triunfo desse conluioO STF, odiado por metade do país por ter possibilitado o retorno à vida pública de Lula e por ter revertido as penas da Lava Jato que incidiram sobre os corruptos mais poderosos do país, agora está de mãos dadas com o Poder Executivo. Às favas com o princípio democrático de independência do magistrado em relação ao poder político.

A democracia do supremo-lulismo é formidável. Que um homem chamado Clezão tenha morrido sob custódia do Estado com um parecer favorável de soltura da PGR engavetado é só um detalhe incômodo. Que um jovem de 24 anos tenha sido condenado a 17 anos de prisão pelo terrível crime de ter entrado no Congresso Nacional em 8 de janeiro e divida a cela com condenados por estupro e homicídio que cumprem pena menor que a dele, é outro detalhe de somenos importância.

Essa é a democracia festejada pelos esquerdistas que aclamam o ministro Alexandre de Moraes aos gritos de “Xandão” e “sem anistia”, enquanto babam de satisfação ao ver a vingança sem tréguas contra seus adversários políticos. 

Mas as prisões da fulana cozinheira, do sicrano pedreiro, do beltrano corretor e de tantas outras pessoas simples, sem nenhum antecedente criminal, deveriam pesar também na consciência dos influenciadores de direita que, durante anos, encheram o próprio bolso com o rentável ofício de blogueiros chapa-branca do bolsonarismo, pagos para reproduzir em seus canais o discurso da ordem do dia.

De Miami ou do conforto do seu sofá, incentivaram e insuflaram a invasão do dia 8 de janeiro, seguindo o exemplo do covarde-mor, o próprio Jair. A peãozada foi presa por Moraes. Os influencers estão curtindo uma temporada nos Estados Unidos. 

Trinta senadores da oposição assinaram um manifesto público em resposta ao evento “Democracia inabalada”, promovido pelo governo federal.

No documento, os signatários condenam “vigorosamente os atos de violência e a depredação dos prédios públicos ocorridos no dia 08.01.2023, em Brasília.” Também alertam que “o abuso dos poderes e o uso indevido de interpretações de dispositivos constitucionais pode matar a democracia” e ainda apelam para a “volta da normalidade democrática”.

Tudo isto está bem dito e é correto, mas não tem força pelo simples fato de que a maioria dos que assinam o documento foram incapazes de romper com o bolsonarismo quando isso se fazia claramente necessário. 

Apontar o que há de autoritário e antidemocrático nos nossos adversários políticos é fácil; difícil é apontar isso dentro do próprio espectro político ou do próprio grupo. A democracia brasileira continuará abalada sempre que a sua suposta salvação retroalimentar o populismo.

‘Queers for Free Palestine' em Delhi Queer Pride walk 2023. | Foto: Manisha Mondal/ThePrint.

Wokismo: o destrutivo tsunami ideológico que ameaça o Ocidente

O jornalista britânico e editor do The Sunday TelegraphAllister Heath, publicou, em 13 de dezembro, um artigo de opinião no qual afirma que “a civilização ocidental está sendo destruída por dentro por forças que não podemos controlar”.

Essas forças de dissolução, segundo ele, foram subestimadas por muito tempo e aqueles que “alertaram para a ameaça devastadora representada pela tomada das nossas instituições por ideólogos conscientes (woke ideologues) foram implacavelmente atacados e ridicularizados”.

“terrível verdade” exposta por Heath no referido artigo é que essas pessoas que supostamente se preocupam com os outros e que dizem acreditar na justiça social e na auto-realização sexual, combater o preconceito, esclarecer a história, promover a igualdade e salvar o planeta são as mesmas que apoiam abertamente o genocídio.

Embora grande parte da mídia esteja embotada pela ideologia woke, o referido artigo do The Telegraph é uma amostra de que vozes qualificadas têm denunciado, aqui e ali, o paradoxo desses que se pretendem politicamente corretos ao mesmo tempo em que relativizam e justificam as piores barbáries.

Recentemente, em 11 de dezembro, o jornal suíço Neue Zürcher Zeitung(NZZ) publicou um artigo de opinião do seu correspondente político, Benedict Neff, intitulado “Traktat über die Verirrten: Der Palästina-Konflikt demaskiert die radikale Linke” (Tratado sobre os Perdidos: O Conflito Palestino Desmascara a Esquerda Radical).

Nesse artigo, o analista político suíço explica a infiltração da ideologia radical esquerdista nas universidades, sob o manto das teses antirracistas e pós-colonialistas, e denuncia a hipocrisia desses radicais diante das atrocidades cometidas pelo grupo terrorista Hamas:

“Há acontecimentos que levam a uma clareza peculiar. Um exemplo é o massacre do Hamas em Israel, em 7 de outubro de 2023. Um desmascaramento ocorreu longe dos combates. Depois de os terroristas palestinos massacrarem e raptarem mais de 1.000 civis inocentes, os ultra-esquerdistas e os islamistas do Ocidente saíram juntos às ruas para se manifestarem contra Israel. O crime não foi motivo para estes esquerdistas radicais mostrarem solidariedade para com as vítimas. Pelo contrário, deram proteção aos flancos dos perpetradores”, escreveu o articulista suíço.

Ambos os artigos citados denunciam que o 7 de outubro escancarou um absurdo padrão de pensamento que já existia há muito tempo, mas não era levado a sério; um padrão de pensamento no qual os modelos ideológicos seriam mais forte do que a compaixão humana:

“Hoje podemos considerar isto ingênuo, mas acredito que muitas pessoas — incluindo muitas da esquerda — só recentemente se tornaram plenamente conscientes do pensamento delirante e mecânico dos extremistas de esquerda, baseado em teorias pós-coloniais e antirracistas. Porque basicamente estes esquerdistas radicalizados disseram: os israelenses não são vítimas e não podem ser vítimas”, escreveu Benedict Neff, no NZZ.

“Forma demente de pensar”

Allister Heath, do The Telegraph, liga essa “forma demente de pensar” ao “destrutivo tsunami ideológico desencadeado pelos fanáticos despertos (woke fanatics)”. Para ele, embora muitos já compreendam, por exemplo, que “o aumento da defesa extrema dos trans levou à mutilação de muitas crianças e à erosão dos direitos das mulheres”“a natureza autoritária, e até mesmo fascista, da ´teoria crítica da raça´ e da ´teoria pós-colonial´ foi subestimada”.

Depois do constrangedor silêncio das organizações feministas em relação à violência sexual contra as mulheres israelenses, deu-se o caso das dirigentes de Harvard, da Universidade da Pensilvânia e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, que, ao serem questionadas por uma comissão do Congresso dos EUA, se recusaram a confirmar que o apelo ao genocídio dos judeus violaria o código de conduta das universidades e disseram, com um sorriso sarcástico nos lábios, que isso “dependeria do contexto”.

Não é de surpreender, afinal, que, para os ideólogos radicais da esquerda, o massacre de 7 de outubro, orquestrado sinistramente pelo Hamas, também não pode ser analisado sem um contexto, ou seja, sem ser justificado dentro da ideologia woke que divide o mundo em opressores e oprimidos.

“O povo judeu é classificado como ´branco´ ou ´branco adjacente´ e, portanto, opressor, e isto supostamente dá aos manifestantes luz verde para entoar slogans que qualquer observador objetivo deveria considerar apoiar o genocídio”, explica o analista do jornal britânico.

Ele lembra ainda o quão essas pessoas que se recusam a criticar as manifestações pró-Hamas antissemitas são “paranóicos obcecados por microagressões com códigos discursivos estritos para prevenir ofensas”.

Duplo padrão

Sob a óptica dessa etiqueta discursiva politicamente correta, que escancara o duplo padrão moral que grassa hoje na maioria das universidades, professores ou estudantes podem ser perseguidos caso errem um pronome de quem mudou a identidade de gênero, mas clamar pela “Intifada revolution” e cantar “from the river to the sea”, que são inequivocamente vistos como apelos ao terrorismo e à eliminação de Israel do mapa, são atitudes analisadas de modo muito complacente, pois dependeriam contexto.

Segundo o artigo do The Telegraph, essa “normalização do racismo com um toque de década de 1930”, que tem tomado conta das universidades, impacta muito negativamente a sociedade:

“O vírus da mente desperta (woke mind) transformou outrora grandes centros de aprendizagem em campos de doutrinação, veículos para fabricar consentimento para ideias niilistas e um novo obscurantismo.”

Ainda segundo o analista britânico, é a “hierarquia de vitimização”, própria da ideologia woke, a razão pela qual algumas pessoas “ainda admiram as moralmente falidas Nações Unidas”:

“O enviado do Irã ter presidido a uma reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, apesar de a República Islâmica ser um dos principais violadores dos direitos humanos não importa, argumentam os extremistas despertos (woke extremists): é um membro do ‘sul global’, lutando contra o ‘imperialismo’.”

O artigo de Allister Heath também critica a UNRWA, tantas vezes denunciada aqui, em O Antagonista:

“Tomemos o exemplo da UNRWA para os Refugiados da Palestina: transformou os seus pupilos numa classe perpétua de refugiados, roubando-lhes a agência e rotulando as suas cidades como “campos de refugiados” permanentes. Os palestinos são o único povo para quem o estatuto de refugiado é automaticamente transmitido através das gerações, garantindo que as suas queixas nunca possam ser resolvidas e que a burocracia da ONU possa manter o seu trem da alegria na estrada. Isto é uma tragédia para os palestinos e torna a paz quase impossível.”

O artigo também tece duras, mas pertinentes, críticas ao ambientalismo de Greta Thumberg, as quais reproduzimos a seguir:

“O ambientalismo de Greta Thunberg parece agora ser uma mera tábua de um movimento revolucionário mais amplo. Entre outros ataques a Israel, ela foi filmada cantando “esmague o sionismo” em um comício em Estocolmo em novembro. Foi também coautora de um artigo para o The Guardian no qual alega que Israel cometeu “crimes de guerra” e “genocídio”, um caso clássico de inversão moral e culpabilização da vítima. […]

O que tem a israelofobia de Thunberg a ver com a abordagem de um problema técnico como o aquecimento global? A resposta é tudo e nada: os fanáticos verdes mais extremos são autoritários woke que querem travar guerra à meritocracia, ao individualismo, à racionalidade, ao capitalismo e até à democracia moderna. As alterações climáticas são apenas um pretexto para fomentar uma convulsão mais ampla. É por isso que tantos verdes radicais não estão interessados em soluções tecnológicas para a descarbonização.

Os aliados de Thunberg acreditam que ‘não há justiça climática sem direitos humanos’. Assim, com a ‘justiça climática’ não se trata de reduzir o crescimento das temperaturas médias: trata-se de destruir Israel, de lutar contra o sonho americano, de eliminar a liberdade de expressão e assim por diante. A ‘justiça climática’ não tem realmente a ver com clima nem com justiça, tal como a ‘justiça social’ é antissocial e injusta.”

A agenda woke, obviamente, não sobreviveria fora do mundo livre e seus defensores seriam friamente eliminados caso os fanáticos islâmicos lograssem êxito em impor sua visão de mundo teocrática. Mas o ódio ao “ocidente colonizador” parece ser maior do que o instinto de sobrevivência que deixaria entrever essa verdade.

“Filosofia para a Palestina”? Habermas e Ferry discordam

A filosofia, aurora do pensamento ocidental, tem sido sistematicamente encurralada nas suas louváveis pretensões de autonomia do pensamento para ser cada vez mais cooptada pela ideologia e pelas ideias nefastas que corrompem e desintegram a sociedade.

No atual estágio de desenvolvimento moral e jurídico da humanidade já deveria haver algumas balizas dentro das quais as ideias seriam discutidas com bom senso, boa fé e respeito a alguns imperativos morais inquestionáveis.

Infelizmente não é esse o caso. Enquanto alguns poucos filósofos conseguem trazer ao debate público ideias sensatas, pertinentes e corretas, a maioria se contenta com aventuras retóricas irresponsáveis nas quais o terror, o ódio e a barbárie são relativizados ou mesmo justificados em nome de ideais políticos. 

É importante, pois, trazer ao conhecimento do público brasileiro as raras vozes que têm nadado contra a maré da indolência intelectual no ambiente acadêmico filosófico. 

Se, por um lado, alguns ideólogos que se pretendem filósofos, assinaram uma carta aberta intitulada Philosophy for Palestine, na qual acusam Israel de genocídio e justificam o massacre do Hamas, por outro lado, o alemão Jürgen Habermas escreveu sua carta aberta Grundsätze der Solidarität. Eine Stellungnahme em condenação ao Hamas e em solidariedade a Israel e aos judeus.

Outro filósofo que entrou corajosamente no debate público, desde o início da guerra Israel-Hamas, é o ex-ministro de Educação da França, Luc Ferry.

Nem Habermas nem Ferry são considerados pensadores de direita. Ambos, porém, distanciam-se do fanatismo da esquerda anti-Israel que radicaliza o ambiente universitário com teses que fazem convergir decolonialismo, antissionismo, antissemitismo e wokismo em um mosaico de ódio e ressentimento contra tudo o que é ocidental, judaico e cristão.

Já comentamos aqui o artigo de Ferry intitulado “judeofobia, compreendendo a nova situação”, no qual o filósofo expõe o ódio ao “ocidente colonizador” como um sentimento catalisador capaz unir a militância de extrema esquerda apologeta do Hamas.

Em novo artigo, publicado também no jornal Le Figaro, Ferry defende que as atrocidades cometidas pelo Hamas em 7 de outubro devem ser consideradas crimes contra a humanidade.

Segundo ele, essa classificação importa ainda mais “porque alguns, cegos pelo velho antissemitismo da extrema esquerda, querem vê-lo como um movimento que ostenta o prestigiado selo da Resistência!” 

O filósofo explica que, para além dos debates que ocupam os juristas quanto à definição deste tipo de crime, “fica claro que os abusos cometidos pelo Hamas contra civis foram de fato perpetrados com uma lógica de extermínio visando toda uma comunidade.”

“Quer tenham sido assassinatos, violações ou torturas diversas, as pessoas raptadas, massacradas ou martirizadas estavam lá por quem eram ou deveriam ser, e não pelo que fizeram ou deveriam ter feito. Prova disso é o fato de até bebês, por definição inocentes, terem sido mortos como judeus, o que é suficiente para definir o crime contra a humanidade e, no final, incluí-los numa categoria mais ampla, o do genocídio”, completa o filósofo francês.

Enquanto a tal carta Philosophy for Palestine insiste na retórica hipócrita de que Israel está cometendo um genocídio em Gaza (retórica, aliás, já criticada na carta aberta de Habermas como “perda completa de parâmetros”), Ferry expõe a obviedade negligenciada pelos ideólogos de extrema esquerda: as atrocidades cometidas pelos Hamas é que “foram levadas a cabo numa lógica claramente genocida”.

Uma curiosidade sobre a carta dos ideólogos assinada por professores de filosofia na América do Norte, na América Latina e na Europa é que, entre as 207 assinaturas, constam as assinaturas de 8 brasileiros, cinco dos quais são cearenses, professores da Faculdade de Filosofia da Universidade Estadual do Ceará (UECE).

Antissemitismo institucional parece não ser mais privilégio da Universidade da Pensilvânia (Penn), de Harvard, do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e congêneres. Pelo que se vê, já há muitas sucursais do tipo pelo Brasil, uma das quais se destaca no nordeste do Brasil. 

Ps. Eu me formei em Filosofia na UECE e lecionei lá durante dois anos até sofrer pesado assédio moral e perseguição ideológica por parte dos mesmos professores que hoje assinam a referida carta. O caso resultou em processos criminais e trabalhistas ainda em curso.

“Allahu Akbar ”: o grito macabro que amedronta o mundo

“Em _____, um grupo de ____homens fortemente armados e vestidos de preto entrou em um _____ em _______ e matou _____ pessoas. Os atacantes foram filmados gritando “Allahu akbar!”. Em entrevista coletiva à imprensa, o presidente _____ disse: “Condenamos esse ato criminoso de extremistas e sua tentativa de justificar seus atos violentos em nome de uma religião pacífica não terá êxito. Condenamos igualmente aqueles que queiram usar essa atrocidade como pretexto para crimes de ódio islamofóbicos”.

É assim que começa o livro Herege: Por que o Islã precisa de uma reforma imediata, da ex-muçulmana, ex-ateia e agora cristã, Ayaan Hirsi Ali. A lacuna no nome do lugar, no número de assassinos e no de vítimas deve-se à grande quantidade de casos semelhantes. O leitor pode preencher as lacunas com o caso mais recente do noticiário.

Após relembrar alguns atentados, a autora escreve que há mais de treze anos vem defendendo um argumento simples em resposta a atos terroristas como estes: “Afirmo que é tolice insistir, como fazem habitualmente nossos líderes, que os atos violentos dos islamitas radicais podem ser dissociados dos ideais religiosos que os inspiram. Temos de reconhecer que eles são movidos por uma ideologia política, uma ideologia com raízes no próprio islã, no livro santo do Alcorão e na vida e ensinamentos do profeta Maomé descritos no hadith.”

A ex-muçulmana diz, com todas as letras, aquilo que os progressistas ocidentais e seus líderes insistem em negar: “Deixo claro o meu ponto de vista nos termos mais simples possíveis: o islamismo não é uma religião pacífica.”

Na contramão das susceptibilidades multiculturalistas que se melindram com esse tipo de argumento “insensível”, Hirsi Ali expõe em seu livro “a ideia de que a violência islâmica não tem raízes em condições sociais, econômicas ou políticas — e nem mesmo em erro teológico —, e sim nos textos fundamentais do próprio islamismo.” Por defender isso, ela foi silenciada, execrada e humilhada não só por muçulmanos, mas também por alguns militantes progressistas e apologistas ocidentais do Islã.

Por inúmeras razões, parte do Ocidente está mais preparado para ser subjugado pelo Islã e padecer sob a espada de Maomé do que para aceitar essa afirmação. Prova disso é que as declarações de Hirsi Ali suscitaram críticas tão veementes que parecia ter sido ela a autora de atos de violência: “pois hoje parece ser crime falar a verdade sobre o islã”, explica Ali. “´Discurso de ódio´é o termo moderno para heresia. E no clima atual, qualquer coisa que faça os muçulmanos se sentirem incomodados é rotulada de ódio.”

Não cabe aqui nesse contexto fazer uma resenha do referido livro, o qual indico como uma leitura atual e importante. Apenas citei a sua tese inicial à guisa de introdução para comentar o último atentado que ocorreu em Paris, em 02 de dezembro, nas proximidades da torre Eiffel.

Um homem de 26 anos matou com uma faca um jovem turista germano-filipino e depois atacou mais duas pessoas com um martelo. Assim como os terroristas do Hamas ao metralharem os jovens da festa rave em Israel e assim como tantos outros terroristas, o assassino Armand Rajabpour-Miyandoab gritou Allahu Akbar antes de esfaquear sua vítima. 

Mas o nome verdadeiro do assassino não é Armand. Um documento, apresentado como extrato do diário oficial de 22 de março de 2002, contendo o decreto de naturalização de membros da família do agressor, circulou amplamente no X (antigo Twitter). Neste documento, o homem é referido como Iman Rajabpour-Miyandoab. Uma fonte policial confirmou à imprensa que o primeiro nome do terrorista foi mudado em 2003, quando ele tinha seis anos.

Iman ou Armand, é filho de iranianos, converteu-se ao Islã na juventude e já planejou um ataque terrorista em 2016, pelo qual foi condenado a cinco anos de prisão. O agressor francês de origem iraniana estava ligado a vários terroristas, incluindo os assassinos de Samuel Paty (um professor morto em 16 de outubro de 2020 perto do colégio Conflans-Sainte) e de Jacques Hamel (padre que teve a garganta cortada no dia 26 de julho de 2016, ao final de uma missa diante de três freiras e um casal de paroquianos). 

Armand também manteve contacto com um jihadista francês que partiu para a Síria e era antigo membro do grupo Forsane Alizza, célula terrorista dissolvida em 2012, que defendia a jihad armada e queria “estabelecer um califado” na França.

Nesse último atentado insere-se também o contexto da guerra Israel-Hamas. Segundo o ministro do Interior francês, Gérald Darmanin, além de gritar “Allahu akbar”, o assassino disse à polícia não tolerar mortes de muçulmanos em Gaza.

Uma reportagem do jornal Le Figaro fez um levantamento: o turista alemão morto em Paris é a 274ª vítima de um ataque islâmico, desde 2012 na França, período no qual ocorreram 26 ataques islâmicos fatais, oito deles após 2020. 

Eis a lista macabra: 


2012: 3 ataques fatais (7 mortos)
2015: 6 ataques fatais (150 mortos)
2016: 3 ataques fatais (89 mortos)
2017: 2 ataques fatais (3 mortes)
2018: 3 ataques fatais (10 mortos)
2019: 1 ataque fatal (4 mortos)
2020: 4 ataques fatais (7 mortes)
2021: 1 ataque fatal (1 morte)
2022: 1 ataque fatal (1 morte)
2023: 2 ataques fatais (2 mortes)

A mídia francesa vem, compreensivelmente, dando grande repercussão ao ocorrido. O diretor de redação do jornal Le figaro, Vincent Trémolent de Villers, escreveuem editorial de 03 de dezembro: 

“A França é um país onde existe o risco de morrer por uma facada a qualquer hora, a qualquer hora, em qualquer lugar. […] A frouxidão migratória, a desintegração cultural, a delinquência sistêmica, o jihadismo atmosférico e a fraqueza judicial estão interligados. Nesta França, o carrasco lamenta-se como vítima e a vítima, dano colateral do grande projeto multicultural, é rapidamente esquecida. Quem se lembra das jovens cujas gargantas foram cortadas há seis anos na estação Saint Charles? Ou do homem assassinado por um refugiado sudanês enquanto abria a janela em total confinamento?” 

A preocupação, porém, do coordenador do partido de extrema esquerda, La France insoumise, Manuel Bompard, não é evitar novos atentados terroristas islâmicos, mas evitar que se dê uma interpretação inadequada a eles: “Vejo claramente que, por exemplo, a questão da loucura deste indivíduo parece estar completamente retirada de questão e, no entanto, parece-me que este é um dos assuntos que terá de ser examinado após esta tragédia”, registrou o coordenador insoumise.

Para Bompard, o ataque com faca que custou a vida a um turista alemão em Paris foi apenas o ato de “uma pessoa claramente desequilibrada” para o qual não se pode “dar significado político geral.” 

Jean-Luc Mélenchon, líder do La France insoumise, também manteve suas considerações limitadas ao perfil psiquiátrico do assassino, sem mencionar as suas motivações terroristas. Tratar-se ia apenas de um homem com distúrbios psiquiátricos que interrompeu seu tratamento medicamentoso: “É hora de percebermos as consequências do colapso do sistema psiquiátrico! Cuidados, monitoramento e confinamento médico são urgentes para diminuir o dano deste tipo de pessoa”, acrescentou o três vezes candidato presidencial. 

Pouco antes do ataque o agressor, que consta na lista policial de radicalização islâmica, assumiu a responsabilidade pelo ataque evocando em um vídeo as notícias, o governo e o assassinato de muçulmanos inocentes. Na hora do assassinato ele gritou “Allahu Akbar”. Mesmo assim, uma vertente política tenta desconectar o crime da questão islâmica. 

Voltemos ao livro de Ayaan Hirsi Ali, escrito em 2015. Deixarei que ela, que conhece o islamismo muito melhor do que eu, conclua esse artigo:

“Já faz quase uma década e meia que temos políticas e pronunciamentos baseados na suposição de que o terrorismo e o extremismo podem e devem ser diferenciados do islã. Sempre na esteira de ataques terroristas em todo o mundo, líderes ocidentais apressam-se a declarar que o problema nada tem a ver com o islã propriamente dito. Porque o islamismo é uma religião pacífica. 

Mas e se essa premissa for totalmente errada? Porque não são apenas a Al-Qaeda e o EI que mostram a face violenta da fé e da prática islâmica. É também o Paquistão, onde qualquer declaração que critique o Profeta ou o islã é considerada blasfêmia e punível com a morte. É a Arábia Saudita, onde igrejas e sinagogas são proibidas, e onde a decapitação é uma forma legítima de punição, tanto assim que em agosto de 2014 houve quase uma decapitação por dia. É o Irã, onde o apedrejamento é uma punição aceitável, e os homossexuais são enforcados por seu “crime”. É Brunei, onde o sultão está reinstituindo a lei islâmica da sharia e a pena capital para a homossexualidade. […]

Atualmente ainda tentamos argumentar que a violência é obra de um punhado de extremistas lunáticos. Recorremos a metáforas médicas, tentando definir o fenômeno como algum tipo de corpo estranho no meio religioso em que ele se propaga. E fingimos acreditar que temos extremistas tão perversos quanto os jihadistas.”

Foto de Taylor Brandon na Unsplash

Israel, Hamas e o crepúsculo do Ocidente

Para mães palestinas que seguram seus filhos feridos não importa a razão de ser do ataque sofrido, para o pai que teve sua família dizimada por terroristas cruéis não importa o motivo do ataque, para os inúmeros reféns que se encontram subjugados e torturados não há barbaridade maior do que a que sofrem. Por qualquer ângulo que se olhe, o martírio de inocentes é injustificável e intolerável. O que deveria causar revolta e indignação é que se tente justificar a crueldade e a barbaridade por floreios retóricos que tomam por base uma argumentação histórica de um conflito milenar.

O mal, quando emerge sob o manto da reivindicação da justiça, é o mal dissimulado e insidioso, é o mal dos hipócritas e dos covardes. E há mal moral enraizado na mente dos que supostamente militam pela paz.

Os pacifistas que fecham os olhos para as atrocidades cometidas contra os seres humanos quando tais atrocidades ferem não aqueles cuja subjugação oferece a bandeira adequada para a sua militância doentia, mas aqueles que supostamente seriam os opressores que a sua ideologia resolveu demonizar são, na verdade, pessoas sem bussola moral, sem integridade e sem equilíbrio para lidar politicamente com uma situação tão delicada como a que o mundo agora vivencia após o atentado terrorista do Hamas.

Não basta clamar por um cessar fogo sem reconhecer que as reivindicações de Israel, como Estado atacado, são legítimas; não adianta apontar os civis mortos no ataque em Gaza sem esclarecer que tais civis são feitos de escudo pelos terroristas que se escondem nos túneis subterrâneos; não serve posar de bom-moço e pedir a paz mundial sem reconhecer que essa paz é reiteradamente ameaçada por déspotas como Vladimir Putin que hipocritamente se coloca no tabuleiro da guerra do Oriente Médio esperando a oportunidade de oferecer seu poderio bélico a todos aqueles que se alinhem à sua insânia expansionista e possam servir aos seus interesses.

Os jovens que se arvoram defensores da liberdade e da igualdade deveriam estar atentos e temerosos com a expansão autocrática contra as democracias liberais, mas, paradoxalmente, o que vemos são estudantes e professores universitários vociferando contra Israel em nome de uma abstração chamada “causa palestina”.

Qual é, afinal, a causa palestina? Quem está travando os tratados de paz senão os próprios fundamentalistas que minam todas as negociações possíveis e espalham o terror para evitar a concórdia? São os terroristas do Hamas que mantêm a população de Gaza subjugada e exposta para que o ódio recrudesça no coração de todos.

Por que a ONU não se interessou em condenar o feroz ataque perpetrado pelos terroristas antes de clamar pela paz? Por que a Assembleia Geral da ONU aprovou um projeto de resolução que pede uma pausa segundo o critério dos Estados árabes alinhados ao que há de mais retrógrado em termos de Direitos Humanos, desconsiderando a decisão coletiva das sociedades livres para as quais Israel tem o direito, senão o dever, de combater e eliminar o grupo terrorista que o atacou? O que faz com que uma instituição como a ONU, que deveria ser um ponto de dissuasão de conflitos, se torne um reprodutor de discursos hipócritas e demagógicos que não aponta com clareza o mal e que foge à responsabilidade de combatê-lo? São respostas difíceis porque talvez a ONU seja apenas o reflexo institucional de um cenário global de ambiguidade moral, de falta de critérios, de perda de prumo e de relativismo doentio.  

O secularismo, tão aclamado por progressistas e materialistas, parece ter levado ao seu oposto: a submissão ao que há de mais radical e primitivo em termos de religião. Por que o Islã não pode se curvar à política liberal do Ocidente, mas a política liberal do Ocidente precisa se curvar ao Islã? Por que o fanatismo de um povo que clama pelo extermínio dos judeus está sendo tolerado e incorporado pela cultura livre que o acolhe? O que significa a place de la République tomada por muçulmanos e simpatizantes gritando “Allah Akbar” após uma carnificina contra os judeus senão o atestado de submissão daquela que foi outrora a pátria dos Direitos do Homem e do Cidadão?

O problema é mais filosófico do que político. O iluminismo, o materialismo, o secularismo, na sua ânsia de renegar o cristianismo e seu legado moral acabou abrindo espaço para outra religião, não compatível com as leis e os costumes ocidentais. O esforço do Ocidente para trocar o cristianismo pelo ateísmo de Estado e virar as costas para sua tradição e para sua história religiosa fragilizou-o sobremaneira.

O niilismo decorrente da falta de raízes permitiu a proliferação de teorias absurdas e aberrantes tidas hoje como respeitáveis e as universidades dissolveram-se no caos do imoralismo que busca antes transgredir do que formar. Sob o nome pomposo de “decolonização”, professores militantes conseguiram fomentar um desprezo pelo que chamam de “eurocentrismo”, que nada mais é que a referência judaico-cristã da história. Movidos por ressentimento e vitimismo, exigem uma retratação em nome de uma suposta marginalização e costumam desprezar os clássicos por se acharem portadores de uma grande verdade atual. Com tudo isso, fizeram da Filosofia uma mera excrescência ideológica na qual se pavoneiam com floreios linguísticos.

Por pouco estudo que se tenha, por pouco que se conheçam os fatos, por simplória que seja a mente de um indivíduo é gritante a iniquidade que há em se justificar atrocidades em nome de uma causa política. O uso da violência no seu aspecto mais bestial não pode ser tolerado e muito menos aclamado. Os intelectuais da extrema esquerda que tratam Israel como “Estado terrorista” e o acusam de genocídio enquanto silenciam sobre a causa original da guerra em curso são ideólogos que falseiam a história.

Nesse crepúsculo do Ocidente haveremos ainda de encontrar vozes lúcidas que renegarão a perfídia. Essas vozes serão muitas vezes silenciadas e perseguidas. Mas elas ressoarão no fundo das consciências momentaneamente obnubiladas pela histeria de um mundo sem rumo e sem fé.

Israel x Hamas: direito de defesa com proteção aos civis

Há uma meta a ser cumprida na guerra Israel-Hamas: a eliminação do grupo terrorista que que invadiu Israel, exterminou e sequestrou civis. Ceder agora é ser passivo diante da monstruosidade perpetrada, é condescender com a barbárie.  

O direito de resposta de Israel à ignomínia à qual seu povo foi exposto é inegável. Não há corrente do Direito Internacional que não reconheça a legitimidade da resposta, uma vez que as fronteiras do país atacado de forma vil e selvagem estão expostas aos terroristas, que não respeitam leis ou tratados.

O direito de defesa pressupõe, no entanto, o respeito às normas internacionais que regem as relações entre os povos. Os civis devem ser protegidos tanto quanto os combatentes do Hamas devem ser alcançados. A estratégia para isso deve ser a entrada em Gaza por terra, uma vez que o bombardeio aéreo indiscriminado daria vitória a Israel, mas à custa de muitas vidas inocentes.

A invasão por terra não será fácil; haverá muitas baixas israelenses. Ou seja, Israel exporá a vida dos seus filhos para resguardar a vida de civis palestinos. Como isso pode ser moralmente equivalente às atrocidades perpetradas pelo Hamas?

Não se trata aqui de guerra comum, onde duas nações se enfrentam por questões econômicas e geopolíticas, mas de conflito no qual há um abismo entre a bestialidade de um ataque terrorista deliberado, com grau de crueldade inimaginável, e a resposta de guerra a ele.

Ambos os eventos são traumáticos, ambos levam ao luto e ao sofrimento, mas um responde à agressão iníqua e está respaldado pelo direito e pelas leis, outro rege uma orquestra demoníaca de vozes enfurecidas que berram contra o fim de Israel e o extermínio dos judeus.

Uma vez nos calamos e demoramos a retaliar. Uma vez esperamos para ver até onde o mal poderia ir. A resposta veio como a máquina infernal da SS, com seus fanáticos enfileirados; a resposta veio com os campos de concentração; a resposta foi a morte de milhões de inocentes. Milhões de judeus.

Não nos cabe agora repreender Israel pelos seus erros no antigo problema com os palestinos. Não cabe porque esse é um problema diplomático, que só poderá ser resolvido se houver diplomacia, algo impossível em um Estado islâmico, uma teocracia na qual o pensamento mundial deve se curvar a Allah e aos seus fiéis.

O mundo ocidental está brincando com o risco da sua própria aniquilação. A impressão que dá é que luta nas ruas, universidades e redes sociais para ser subjugado por um poder despótico e cruel.

O movimento político-ideológico que sustenta o Hamas tem ramificações enormes, por isso a mídia ainda não se colocou formalmente ao lado de Israel, banindo de seus quadros aquele que manifeste inclinações antissemitas e favoráveis aos terroristas. Mas é imperioso que emissoras e redações condenem formal e explicitamente um discurso cujo resultado já vimos no passado.

O holocausto foi possível porque a máquina de propaganda nazista foi eficaz, porque a aquilo que há de pior na espécie humana foi catalisado por líderes através do imenso poder da propaganda.

Os que hoje silenciam frente ao horror do atentado contra os israelenses, silenciariam na terrível noite dos cristais; os que hoje comemoram o que consideram uma façanha do Hamas, comemorariam os expurgos de Hitler. A desumanidade quando vista e não condenada abre espaço para desumanidades maiores e cada vez mais aberrantes.

Não há que se negar a boa fé e o senso de justiça dos que verdadeiramente almejam a paz entre os dois povos, mas há que se considerar que, uma vez que o mal tomou o caminho deliberado de negá-la, o bem não pode silenciar e esconder-se. Trata-se de uma resposta humana, dentro da humana falibilidade.

O mundo não é o paraíso celeste de espíritos redimidos. O mundo é o que é: um lugar de lutas e aprendizados, expiações e provas, dores e resgates. É neste quadro que devemos nos mover. E quando a guerra começa é preciso saber para que lado ir. O meu lado é o da civilização.